Rastreio do cancro do pulmão: “É preciso vontade política e ação. E isso não se tem visto”
António Araújo, diretor do Serviço de Oncologia Médica da ULS de Santo António, no Porto, critica atrasos na implementação de rastreio que "salva vidas nesta área".
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Como se explica este aumento da mortalidade?
Primeiro, há um aumento do número de casos de cancro do pulmão, que tem vindo a crescer ao longo dos anos. Depois, há uma melhor eficácia dos registos, muito mais fidedignos do que há 20 anos.
O envelhecimento da população pesa?
Claro que sim. Relativamente ao tabaco, o consumo por homens jovens tem vindo a diminuir enquanto tem aumentado nas raparigas. Depois, há uma décalage entre o início do consumo e o aparecimento de cancro do pulmão que ultrapassa os 25 anos. Estamos a medir a mortalidade das pessoas que começaram a fumar há 20 anos e a ver o reflexo do grande consumo de tabaco que tínhamos.
Falou das raparigas. A taxa de mortalidade por cancro do pulmão nas mulheres duplicou.
Está muito ligado ao consumo de tabaco, seja direto ou pela exposição. As mulheres, há quatro décadas, estavam muito expostas. Mas, entretanto, começaram a adquirir este hábito que era dos homens. Quando se analisa as taxas de mortalidade nos últimos anos, só o pulmão e o pâncreas estão a subir. Tem muito a ver com este aumento do consumo de tabaco nas mulheres.
O que falta fazer na lei do tabaco?
Falta aumentar a sensibilização, particularmente dos jovens, integrando o tema no currículo das escolas primárias. Criar condições para que quem quer deixar de fumar tenha acesso facilitado a consultas de cessação tabágica. Aumentar o preço do tabaco via imposto, porque é o principal dissuasor para o início e o consumo. Vigilância e fiscalização da venda a menores e comparticipar o preço dos medicamentos que demonstrem que permite a cessação. Por fim, apostar fortemente no rastreio do cancro do pulmão.
Sabendo o tempo decorrido para alargar a faixa etária no caso do cancro da mama...
Estou muito cético. O senhor coordenador das Doenças Oncológicas, que teria a responsabilidade nesta matéria, tem sido de uma inoperância gritante. Estamos à espera do projeto-piloto. A Pulmonale apresentou à ministra da Saúde um projeto de rastreio. Havia financiamento europeu e até este momento nada aconteceu. Está provado que o rastreio salva vidas nesta área. E o diagnóstico precoce permite poupar dinheiro ao erário público.
O que falta, então?
É preciso vontade política e ação. E isso não se tem visto, infelizmente.