Reguladora propõe medida para incentivar separação que irá vigorar em todo o país a partir de 2024, mas admite tarifas posteriores. Municípios pedem ajudas para investimento.
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A Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) defende que a recolha de biorresíduos, que será obrigatória em todo o país a partir de 1 de janeiro de 2024, deve ser isenta de custos para incentivar a adesão. Vários municípios do país já têm em andamento projetos-piloto e Sintra está a dar um desconto de um euro por cada 30 dias no tarifário dos serviços de águas e resíduos a quem adere ao sistema. São estes resíduos alimentares e provenientes de jardins e parques que pesam mais na quantidade de lixo produzido, mas poucos cidadãos os separam.
Num projeto de recomendação, a ERSAR defende que é preciso adotar uma "estratégia concertada que, por um lado, viabilize a rápida implementação da recolha seletiva de biorresíduos e, por outro, incentive uma crescente adesão dos cidadãos". Na "fase inicial", que não delimita no tempo, a entidade recomenda que a tarifa seja "igual a zero". Depois, "poderá ser equacionada a redução progressiva da subsidiação das tarifas", ou seja, que os cidadãos passem a pagar tarifas.
A cobrança também não seria fácil. Atualmente está indexada à fatura da água e o "Pay As You Throw" - sistema que permite cobrar a quantidade de lixo efetivamente depositada e que apenas existe em alguns projetos-piloto -, só será obrigatório em 2026. A ERSAR diz que "as entidades gestoras podem antecipar a sua implementação".
No último relatório anual sobre Resíduos Urbanos, a Agência Portuguesa do Ambiente revela que é "notório o elevado contributo da fração dos biorresíduos" no lixo total. Em 2021 representaram 45,48% dos resíduos urbanos e apenas 7,86% da recolha seletiva. Nesse ano, foram recolhidas em todo o país 83 156 toneladas de forma seletiva, o que representa apenas 4,5% do total de biorresíduos.
No ano passado (de janeiro a setembro), a Lipor (que trata dos resíduos do Grande Porto) e a Valorsul (que trata do lixo de 19 municípios da Área Metropolitana de Lisboa e região Oeste) recolheram 66 375 toneladas de biorresíduos.
Garantir financiamento
Para Luísa Salgueiro, presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), "faz sentido criar incentivos à separação dos biorresíduos na origem para maximizar a quantidade e a qualidade da matéria orgânica, com a bonificação de 100%, ou seja, a tarifa zero, a aplicar, quer pelo município ao produtor, quer pelas entidades em alta ao município".
Luísa Salgueiro diz ainda que serão necessários "avultados investimentos" para a concretização de novas redes de recolha, assim como para a maximização da capacidade instalada para o tratamento destes resíduos em alta. Por isso, "sendo este um setor já assumido pelo próprio Governo como muito subfinanciado, a ANMP entende que é fundamental garantir o financiamento destes custos elevados e acrescidos, seja pelo Orçamento do Estado, seja pelos fundos comunitários ou pelo fundo ambiental para cumprirmos as metas".
Para Sara Correia, da associação ambientalista Zero, as tarifas "terão sempre de ser associadas a bons sistemas de recolha". Muitos municípios "estão a optar por sistemas na via pública com contentores similares aos do lixo indiferenciado, sem acesso controlado". Catarina Rodrigues, da Quercus, alerta para o custo acrescido das autarquias que ficam mais afastadas das centrais de valorização orgânica, que poderão ter de equacionar a "compostagem comunitária".
Saber mais
O que são?
São os resíduos biodegradáveis de jardins e parques, os resíduos alimentares e de cozinha das habitações, restaurantes, grossistas, cantinas e similares, assim como provenientes de unidades de transformação de alimentos.
Restauração
As entidades com atividade de restauração e industrial que produzam mais de 25 toneladas de biorresíduos por ano são obrigadas pelo Regime Geral de Gestão de Resíduos a fazer a sua separação na origem desde o início deste ano.
Verdes
Muitos concelhos têm estratégias específicas para os verdes (ramagens e outros resíduos de jardins, parques e similares). Em Gondomar, desde 2006, há contentores nos cemitérios e campos de futebol e foi criado um circuito de recolha ao domicílio.
Dados
10 mil toneladas de biorresíduos recolhidas em 2021 e cerca de 6100 no primeiro semestre de 2022 só no Porto.
19 capitais de distrito e áreas metropolitanas têm recolha porta a porta ou compostores domésticos e comunitários.