O Fundo de Garantia de Viagens e Turismo (FGVT), criado para compensar os consumidores cujas experiências com agências correram mal, reembolsou mais de um milhão de euros em 2023 e 2024. O valor das restituições cresceu quase 20 vezes entre 2020 e o ano passado, na sequência dos cancelamentos de viagens na pandemia.
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Agências de viagens que fecharam ou faliram, experiências contratadas que foram canceladas, excursões programadas que não se realizaram. São inúmeros os motivos que levam os viajantes a recorrer ao FGVT, gerido pelo Turismo de Portugal, para serem compensados por uma quebra no contrato que assinaram. Nos últimos cinco anos, o mecanismo procedeu a quase seis mil reembolsos, no valor de 3,9 milhões de euros, mais de dois terços atribuídos em 2023 e 2024.
Segundo os dados cedidos ao JN pelo Turismo de Portugal, 2022 foi o ano em que a comissão arbitral - uma das três vias para o acionamento do fundo - recebeu mais pedidos, 5257 no total, sendo o ano seguinte aquele em que se efetuaram mais reembolsos: 3087, no valor de 1,6 milhões de euros. Os efeitos da pandemia explicam a corrida ao FGVT, que só no primeiro trimestre deste ano já procedeu a 122 restituições, no valor de 119 331,10 euros. "Em 2020, 2021 e 2022, a comissão arbitral recebeu milhares e milhares de processos, o que atrasou muito as decisões. Houve milhares de viagens canceladas, inclusivamente viagens de finalistas, o que obrigou à criação de uma task-force", justifica Diogo Martins, jurista da Deco e membro da comissão arbitral do Turismo de Portugal.
Vínculo com uma agência de viagens
Conforme explica o jurista, o FGVT destina-se aos viajantes que tenham "algum tipo de crédito com uma agência de viagens" e pode ser ativado quando há incumprimento por parte da agência ou quando o cumprimento é defeituoso. "Tem de ser uma viagem organizada, não podemos falar só da compra autónoma de bilhetes de avião, por exemplo", alerta Diogo Martins, frisando que para ter direito ao reembolso é obrigatório que o consumidor tenha um vínculo com uma empresa de viagens.
Entre o leque de reclamações mais frequentes, o fecho de agências de viagens ocupa o lugar cimeiro. De acordo com o Turismo de Portugal, entre 2020 e 2022, houve 507 registos cancelados, uma vez mais como consequência dos sucessivos confinamentos. "Na altura da pandemia, houve inclusivamente casos de agências que recomendaram aos consumidores que recorressem ao fundo. Foram anos muito complicados, em que muitas delas foram obrigadas a fechar portas", recorda Diogo Martins. Além disso, muitas queixas são motivadas por incumprimentos contratuais, desde a falha de uma atividade prevista ao pagamento de refeições acordadas. "Podemos ver coisas de valor jurídico muito baixo, até abaixo dos 100 euros, como acima dos 20 ou 30 mil euros". Uma das situações mais frequentes prende-se com as viagens de finalistas dos estudantes.
Para aceder ao FGTV, o viajante terá de ter uma decisão favorável resultante de uma sentença judicial (caso tenha recorrido a um tribunal, Julgado de Paz ou centro de arbitragem), um parecer positivo da comissão arbitral do Turismo de Portugal ou do provedor do cliente da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT). Só depois deste processo, que demora vários meses a estar concluído, é que o consumidor pode acionar o fundo, através do site do Turismo de Portugal, para reaver o dinheiro perdido. "O que o fundo de garantia faz é notificar a agência de viagens para fazer o pagamento em dívida. Se a agência não cumprir com o consumidor, o fundo substitui-se à agência e depois resolve a situação com a própria agência", detalha.
No ano passado, o FGTV foi acionado em consequência de 522 decisões, distribuídas por 503 deliberações da comissão arbitral, sete decisões do provedor do cliente da APAVT, oito sentenças de tribunais arbitrais e Julgados de Paz, uma sentença do tribunal de Vilnius, na Lituânia e três sentenças de tribunais judiciais.
O jurista da Deco alerta para a necessidade de os viajantes documentarem todas as transações, comunicações e acordos realizados com as agências de viagens, de forma a sustentarem os pedidos. O membro da comissão arbitral do Turismo de Portugal aponta também o facto de o FGTV só reembolsar até ao valor total do contrato com a agência de viagem, o que não incluiu indemnizações.