Porto cheio na despedida de Bento XVI, em espírito de missão. Ou de proselitismo, assuma-se. Perante a multidão extática, o apelo foi não apenas à assunção da religiosidade ou ao despontar das vocações, mas também à conversão.
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"O cristão é, na Igreja e com a Igreja, um missionário de Cristo enviado ao mundo", disse o Papa, numa homilia em que, em termos de fundamentação teológica, salientou que esta tarefa consiste em "renovar a face da terra a partir de Deus, sempre e só a partir de Deus". Uma homilia em que, igualmente, admitiu que, "nestes últimos anos, alterou-se o quadro antropológico, cultural, social e religioso da humanidade". Tal facto, reconheceu o Sumo Pontífice, leva a Igreja a estar "pronta a dialogar com culturas e religiões diversas, procurando construir juntamente com cada pessoa de boa vontade a pacífica convivência dos povos".
Obviamente significativa, em face a uma das mais recorrentes críticas a este pontificado (o alegado retrocesso no ecumenismo e no diálogo inter-religioso), esta nota de abertura de Bento XVI não estava, porém, no cerne da mensagem que o Papa decidiu transmitir a cerca de 150 mil fiéis congregados no coração da cidade do Porto.
Sendo a missão prioridade pastoral da diocese portucalense no ano que decorre, a coincidência de a liturgia de ontem ser consagrada ao apóstolo Matias (o primeiro a juntar-se aos discípulos de Jesus, tomando o lugar de Judas Iscariote), trazia, além dos paramentos vermelhos usados pelos eclesiásticos, esse apelo à conversão ou ao reforço da vivência cristã, como, aliás, viria a ser reforçado em mais do que uma passagem da oração dos fiéis (atenda-se a que toda a cerimónia foi programada, também em termos litúrgicos, em permanente articulação com o Vaticano).
"Hoje celebramos a sua (do apóstolo Matias) memória gloriosa nesta 'Cidade Invicta', que se vestiu de festa para acolher o sucessor de Pedro", assinalou o pontífice romano, que na própria homilia agradeceu às autoridades civis que cooperaram na organização da visita, incluindo o presidente da Câmara, que lhe entregou as chaves da cidade e que se lhe dirigiu na língua de Goethe (o sentido utilitário de ter estudado no Colégio Alemão).
A saudação principal ao Papa, lançada a partir do gigantesco templo a céu aberto aberto - com ameaças de chuva mal concretizadas - em que se transformou o centro da cidade, coube ao bispo do Porto. D. Manuel Clemente, além de sublinhar "a clarividência e a determinação" do magistério de Bento XVI, salientou a necessidade de que "os sinais de vida e de esperança sempre se sobreponham às dificuldades e decepções que a actualidade social e económica, acompanhadas pela grande indefinição cultural, tantas vezes trazem".
Milhares de pessoas não viram o Papa senão através dos ecrãs gigantes instalados. Enchiam-se, portanto, os espaços limítrofes, com gente que chegou à zona já depois do fecho das barreiras policiais, quando ainda havia bastante espaço disponível na placa central da Avenida dos Aliados.