Não é costume que um Papa se sinta na obrigação de dar explicações sobre as suas decisões.
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Foi o que fez Bento XVI numa carta aos bispos. Denuncia quem o criticou pela revogação da excomunhão de quatro bispos, ordenados em 1988 pelo arcebispo Lefèbvre sem mandato da Santa Sé. Lamenta que tenha sido ferido por "uma lança em riste", tendo sido o seu gesto obscurecido pela polémica em torno de posições negacionistas de um deles, Richard Williamson, sobre o Holocausto.
Bento XVI censura quem se opõe a qualquer diálogo com a Fraternidade São Pio X, que reúne os lefebvrianos: "Devemos remeter à indiferença uma comunidade que conta com 491 padres, 215 seminaristas, 117 frades, 164 freiras, e milhares de fiéis? Devemos mesmo deixá-los afastarem-se da Igreja? Poderemos simplesmente excluí-los, enquanto representantes de um grupo marginal e radical, da busca pela unidade e reconciliação?".
Reafirma que não tinha conhecimento das posições do bispo Williamson, mas emenda a mão ao admitir que, no futuro, a Santa Sé deverá estar mais atenta à Internet, como "fonte de notícias". Era o que se exigia à Cúria Romana.
O que mais lamenta é que o seu "gesto discreto de misericórdia" se tenha transformado, na opinião pública, numa espécie de "desmentido da reconciliação entre cristãos e judeus e, consequentemente, como a revogação de quanto, nesta matéria, o Concílio tinha deixado claro para o caminho da Igreja". Agradece aos "amigos judeus que ajudaram a eliminar prontamente o equívoco e a restabelecer aquela atmosfera de amizade e confiança que, durante todo o período do meu pontificado - tal como no tempo do Papa João Paulo II -, existiu e, graças a Deus, continua a existir".
Desmente que a sua misericórdia para com os lefebvrianos, dissidentes do Concílio Vaticano II e que ainda não confirmaram se aceitam ou não o seu magistério, bem como o magistério pontifício posterior, signifique, da sua parte, qualquer intenção de voltar ao período pré-conciliar.
Com a carta aos bispos, o Papa dá uma "palavra esclarecedora", sinal de que, para além das críticas que o agastaram, houve má gestão na Cúria Romana. Além do "caso Williamson", a carta admite outro erro, ao não se ter definido o objectivo da decisão sobre as excomunhões tomada no passado dia 21 de Janeiro. O Papa quer agora restabelecer a paz.