A satisfação dos utentes com os cuidados de saúde prestados pelos médicos de família é elevada, mas os tempos de espera por uma consulta agravam-se. Um inquérito da Deco Proteste revela que 31% dos utentes estiveram mais de dois meses à espera de consultas consideradas não urgentes.
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A tendência de satisfação dos utentes com os cuidados de saúde prestados pelos médicos de família no SNS é crescente. Os dados divulgados pela Deco Proteste propósito do Dia Mundial do Doente, que se assinala esta terça-feira, mostram que, nos últimos 25 anos, o grau de satisfação perante os profissionais subiu de 6,6 pontos para 8 pontos numa escala de avaliação de 0 a 10.
Embora a evolução seja positiva, a organização de defesa do consumidor alerta que “o acesso a consultas continua a ser um desafio, com tempos de espera preocupantes”. Os longos tempo de espera afetam a satisfação global dos utentes com os centros de saúde, apesar de também ter subido de 5,1 pontos para 6,4 na mesma escala. Os resultados constam de um inquérito, realizado entre junho e julho de 2024, que contou com 6210 respostas.
Mais de metade dos utentes (52%) revelaram ter aguardado pelo menos um mês por uma consulta não urgente, e em 31% dos casos a espera ultrapassou os dois meses. Segundo a Deco Proteste, os tempos de espera agravaram-se face aos apurados em 2019, ano em que apenas 31% das consultas implicaram uma espera superior a um mês.
No que toca às consultas de enfermagem, o cenário é inverso: 41% dos inquiridos revelaram ter esperado apenas um dia e 33% entre dois a menos de sete dias, sendo residuais os casos de quem teve de esperar mais de um mês (5%) e dois meses ou mais meses (4%). Os dados mostram que a satisfação dos utentes com os cuidados de enfermagem e com os serviços administrativos também subiu, situando-se, respetivamente, nos 7,4 pontos e 6,2 pontos.
Sem médico de família atribuído
O estudo revela ainda que 993 dos mais de 6 mil inquiridos, o correspondente a 16%, não têm médico de família atribuído, um resultado que a Deco Proteste aponta estar “em linha com os dados oficiais”. No final de 2024, o número de utentes sem médico de família mantinha-se acima dos 1,5 milhões, ainda que tenha diminuído 7,5% entre janeiro e dezembro, segundo os dados do portal da transparência do SNS.
Para mitigar o problema, o Governo quer criar 20 novas unidades de saúde familiar (de modelo C) privadas ou do setor social, exclusivas a utentes que não têm médico de família atribuído e que residem em zonas consideradas como carenciadas onde a taxa de cobertura de profissionais seja inferior à média nacional. A medida tem sido alvo de críticas, nomeadamente por parte dos sindicatos do setor da saúde que acusam o Governo de estar a optar pela privatização dos centros de saúde.
A dificuldade em marcar consultas refletiu-se na procura pelas urgências nos hospitais públicos: 46% dos inquiridos disse ter recorrido aos serviços devido à indisponibilidade de serem vistos numa consulta de urgência no centro de saúde. Por outro lado, 30% dirigiu-se às urgências porque o centro de saúde estava fechado e 24% devido ao horário muito limitado dos cuidados primários. Os dados revelam ainda que 34% dos inquiridos contactaram a linha SNS 24 antes de recorrerem às urgências, enquanto 64% dirigiram-se diretamente aos hospitais.
Perante os resultados, Nuno Figueiredo, porta-voz na área da Saúde da Deco Proteste, citado em comunicado, sugere que se concretizem “estratégias que garantam o acesso a cuidados de saúde primários a todos os cidadãos”, mas também um reforço de programas de prevenção, a valorização dos profissionais de saúde, um aumento dos recursos humanos e a implementação de modelos de trabalho em equipa.
Maior satisfação no Norte
Em termos globais, foi nos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACeS) do Grande Porto V (Porto Ocicental), do Cávado I (Braga) e em Matosinhos que se verificaram níveis de satisfação dos utentes mais elevados. Em contrapartida, os níveis mais baixos dizem respeito a unidades da Lezíria (Santarém), Arrábida (Setúbal), Arco Ribeirinho (Alcochete, Barreiro, Moita e Montijo), Guarda, Sintra, Baixo Alentejo (Beja), Trás-os-Montes e Pinhal Litoral (Leiria).
Recorde-se que em 2024 arrancou a nova fase de reorganização do SNS, que ditou a extinção dos ACeS, substituídos pelas 31 novas Unidades Locais de Saúde (ULS), a somar às oito existentes.