Litoral português sofrerá alterações significativas até 2050, obrigando a realojar populações em locais mais seguros. Em várias cidades do Mundo, há 300 milhões de pessoas na linha de perigo.
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Se não forem tomadas medidas para reduzir a emissão de gases para a atmosfera, nos próximos 30 anos haverá cidades submersas devido à subida drástica do nível do mar. Veneza (Itália), Banguecoque (Tailândia), Mumbai (Índia) ou Xangai (China) poderão desaparecer do mapa. Em Portugal, áreas costeiras vão sofrer mudanças consideráveis.
A conclusão é de um estudo recente de dois investigadores americanos, Scott Kulp e Benjamin H. Strauss, para a Climate Central, associação sem fins lucrativos que se destina à divulgação das consequências das alterações climáticas a curto e médio prazo. A análise aponta que o nível das águas "é já suficientemente alto para ser considerado uma ameaça para 300 milhões de pessoas" que habitam paisagens geográficas em rápida e constante mutação, sobretudo no continente asiático. Tendo em conta que a população mundial deverá aumentar em um bilião até 2050, sobretudo em grandes cidades litorais, a perspetiva é que "ainda mais pessoas ainda sejam forçadas a abandonar áreas perigosas." Num cenário mais pessimista, dois mil milhões de pessoas poderão vir a ser afetadas, qualquer coisa como praticamente o dobro da população da China ou da Índia (1,3 e 1,2 biliões, respetivamente).
"Além da questão das emissões humanas para a atmosfera, outro fator que contribui sobremaneira para a subida do nível do mar é a tendência natural para o levantamento da crosta terrestre. Não sabemos como os solos se vão comportar nos próximos anos", avisa Pedro Proença da Cunha, professor catedrático de Geologia na Universidade de Coimbra.
Populações em risco
Portugal não foge à regra do alerta iminente. A Climate Central criou um mapa interativo que sublinha a vermelho carregado todas as regiões que o mar irá engolir até 2050. Aveiro será dos distritos mais afetados, com o mar a colocar em perigo uma vasta área que se estende quase até Albergaria-a-Velha, já no interior. Um pouco mais a sul, na Figueira da Foz, as águas penetrarão igualmente para zonas interiores, até Montemor-o-Velho. A Nazaré e São Martinho do Porto, já em Leiria, também se encontram em perigo.
"Estamos a falar de permanente perda de território nacional para o mar. É um cenário de não retorno que tem sido combatido com medidas avulsas, algumas delas contraproducentes. No futuro será necessário, apesar de doloroso, desalojar pessoas para locais mais seguros", entende o geógrafo Rio Fernandes.
Lisboa verá o cenário ribeirinho severamente alterado. O caudal do estuário do Tejo subirá e colocará em risco uma vasta área da Margem Sul, da Trafaria ao Samouco. Para prevenir tais alterações, a Área Metropolitana de Lisboa anunciou, recentemente, um plano de 50 medidas, entre elas a construção de muros contra inundações, a melhoria e reforço de habitações ou ações de arrefecimento do espaço público.
Além das zonas de praia, há aglomerados habitacionais que terão de ser adaptados
O mar provocará também a subida do Sado, nas redondezas de Setúbal, e poderá absorver extenso perímetro no Algarve, sobretudo entre Lagos e Portimão, e Vilamoura e Tavira.
"Além das zonas de praia, há aglomerados habitacionais que terão de ser adaptados. Um outro tipo de planeamento urbano é necessário e urgente tendo em conta uma realidade praticamente inevitável", considera Paula Teles, engenheira especialista em planeamento e mobilidade.
O Estado, através da Agência Portuguesa do Ambiente, tem previstos desde 1998 os Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC), que dividiram a costa em nove zonas sensíveis e estabeleceram medidas de prevenção, que incluem planos de demolição de edifícios. Entre eles estão o Edifício Transparente (Porto) e outras 33 estruturas situadas na faixa compreendida entre Caminha e Espinho, tal qual anunciou o ano passado o Governo.
Paula Teles entende, porém, que ainda há muito por executar para fazer frente às ameaças que as alterações climatéricas provocarão. "Tudo se passa, ainda, à escala municipal, quando o que a situação pede é um plano nacional de emergência, traduzido em apoio financeiro do Governo, que atualmente não existe ou é escasso. As câmaras, por si só, não têm autonomia nem disponibilidade financeira para levarem a cabo sozinhas medidas mais abrangentes", denuncia.