Em Portugal, são diagnosticadas quase 3 mil pessoas com cancro da cabeça e pescoço por ano e mais de metade recebe um diagnóstico tardio, prejudicando a sua possibilidade de recuperação. Especialistas organizam rastreios no Porto e em Lisboa no próximo dia 20 de setembro, nesta quarta-feira.
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Para Ana Joaquim, presidente do Grupo de Estudos para o Cancro da Cabeça e Pescoço (GECCP), “quase três mil novos diagnósticos anuais é um número bastante expressivo. Dentro destes casos, a maioria é diagnosticada muito tarde, ou porque os doentes não valorizam os sintomas ou porque não são valorizados quando procuram ajuda”.
Para aumentar o conhecimento sobre este cancro, o Grupo de Estudos para o Cancro da Cabeça e Pescoço realiza a 11.ª semana de sensibilização com a campanha Makes Sense. “Este ano, [a campanha] reforça a importância das três fases de prevenção: primária, que passa pela prevenção do desenvolvimento do cancro da cabeça e pescoço através de atividades para alterar os comportamentos de alto risco e a vacinação contra o HPV; secundária, com foco na melhoria do diagnóstico e do tratamento precoces, através da educação para os sinais e sintomas; e terciária, destinada a melhorar a qualidade dos cuidados prestados aos doentes, para prevenir complicações e aumentar a qualidade de vida dos sobreviventes”, explica.
“Os casos diagnosticados numa fase inicial são tratados mais facilmente, sendo a sua taxa de cura de 80 a 90% durante os primeiros cinco anos. No entanto, dos diagnósticos feitos, 60% são tardios e, para estas pessoas, a probabilidade de cura baixa para os 50%”, explica Ana Joaquim, ao JN.
O cancro da cabeça e pescoço é uma designação que agrupa tipos de cancro que podem afetar vários órgãos – órgãos por onde passa comida e ar, ou seja, as vias aerodigestivas, como a boca, nariz, faringe ou laringe. Dentro do cancro da cabeça e pescoço, existe o cancro da laringe, da cavidade oral, da orofaringe, hipofaringe, nasofaringe, cancro das glândulas salivares, entre outros. Ana Joaquim explica que o consumo de tabaco e de álcool “causa mutações nas células das vias aerodigestivas, que, quando estas substâncias passam, repetidamente, por estas vias, pode desenvolver células cancerígenas”.
Segundo a presidente do GECCP, os sintomas estão ligados às vias aerodigestivas, como “feridas na boca, aftas, dificuldade em engolir, respirar ou rouquidão”, entre outros. Ana Joaquim alerta para a persistência dos sintomas, “por exemplo com as aftas que vêm e vão". A diferença reside no facto de "não se curarem. Se os sintomas durarem mais de três semanas, é altura de consultar um médico”, explica a especialista.
Recuperação depende do diagnóstico
O principal fator que dificulta a recuperação dos pacientes “é o tipo de tratamento que recebem”. Esse tratamento depende se receberam o diagnóstico numa fase inicial ou tardia. “Os doentes podem precisar de uma pequena e focada cirurgia, caso o cancro tenha sido descoberto no inicio. Por outro lado, com a doença já avançada, pode ser necessário tratamento de radiografia, o que trás os seus problemas. Nestes casos, as cirurgias podem implicar a remoção de parte da mandíbula ou da língua, o que implica reconstruções com músculos de outra parte do corpo e o corpo pode rejeitar isto, o que cria problemas adicionais”.
Ana Joaquim esclarece, ainda, que o cancro da cabeça e do pescoço “causa alterações em funções vitais e sociais, como a alimentação, a fala e a respiração. A necessidade de alimentação por sondas, por não ser possível comer pela boca, pode ser motivo de vergonha e isolamento social, familiar e profissional. A necessidade de respiração por um traqueostoma, com limitação da fala a acompanhar, pode ser, também, causa de stress para o próprio e estranheza para quem rodeia, bem como a ausência de dentes, muitas vezes consequência dos tratamentos cirúrgicos e de radioterapia. A dependência de substâncias nocivas, como o tabaco e o álcool, tornam estes sobreviventes muito vulneráveis”.
A campanha Makes Sense vai incluir rastreios ao cancro da cabeça e pescoço no dia 20 de setembro, nesta quarta-feira. No Porto, será, das 14 às 17 horas, no espaço físico da Consulta Externa de Otorrinolaringologia do Centro Hospitalar de São João. Em Lisboa, será nos pólos da Comunidade Vida e Paz, em Chelas, e na Quinta do Lavrado-Penha de França, das 14 às 18 horas. Esta campanha é liderada pela Sociedade Europeia de Cabeça e Pescoço (EHNS) e visa aumentar a consciencialização sobre o cancro da cabeça e do pescoço para melhorar os resultados de saúde dos doentes. Realiza-se anualmente e visa educar os participantes na prevenção da doença e na compreensão dos sintomas precoces, promovendo a troca de conhecimento entre especialistas e o público em geral.