Um inquérito feito pela Federação Académica do Porto (FAP) aos estudantes de instituições de Ensino Superior revelou que 18% dos deslocados não bolseiros ponderam abandonar os estudos. A percentagem é o dobro da expressa por bolseiros.
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O resultado fez disparar os alarmes nas associações e federações académicas, que veem na quebra dos pedidos de renovação da bolsa outro sinal de que o abandono será o maior desafio do próximo ano letivo. Com os Serviços da Ação Social (SAS) "no vermelho" pela perda de receitas, os alunos alertam que os apoios de emergência estão em risco.
"Os estudantes não bolseiros que se encontram deslocados são os que apresentam números mais alarmantes", porque a probabilidade de abandono "é exponencialmente superior" - é o sêxtuplo dos não bolseiros não deslocados (3%).
"Um em cada três estudantes depara-se com dificuldades para suportar as despesas e um em cada cinco pondera abandonar", conclui o estudo.
O alerta já foi transmitido ao Governo, bancadas parlamentares e presidente da República. No próximo ano letivo, os estudantes vão ter acesso a mais bolsas e pagar menos propinas, mas as mudanças já estavam previstas no Orçamento do Estado para 2020 antes da pandemia, sublinham os dirigentes académicos, que garantem ser necessário mais financiamento para responder preventivamente à crise socioeconómica.
Menos pedidos
De acordo com dados da Direção-Geral do Ensino Superior, desde 25 de junho até 12 de agosto, foram feitos 19 295 pedidos de renovação de bolsa, menos 4561 do que em igual período do ano passado e o número mais baixo dos últimos quatro anos. Começando por sublinhar que ainda é cedo para tirar conclusões, os dirigentes das federações do Porto e de Lisboa e das associações de Aveiro, Minho, Beira Interior (UBI) e Trás-os-Montes (UTAD) acreditam que os pedidos vão aumentar e que a quebra se deve à "indefinição" do próximo ano, nomeadamente em relação ao regime de aulas e alojamento. Mas, receiam, pode ser um "sinal" da intenção de abandono.
"Prejuízos brutais"
"Podemos estar à beira de uma catástrofe", receia o presidente da FAP, Marcos Alves Teixeira, que teme pela sustentabilidade do sistema: "As instituições perderam receitas, as despesas vão disparar e ainda nenhum pacote financeiro foi anunciado".
A perda de receitas dos SAS nas cantinas, bares, residências e instalações desportivas foi, no caso da Universidade de Aveiro, de "600 mil euros nos últimos quatro meses", diz António Alves. Na UBI, rondará o "meio milhão", revela Ricardo Nora. E, na de Lisboa, atingirá os dois milhões, já assumiu o reitor. "Prejuízos brutais, que podem limitar a capacidade e qualidade de resposta dos serviços", frisa José Pinheiro (UTAD). O maior receio, alertam em sintonia, é que são essas receitas que financiam os fundos de emergência.
"O que se prevê é que os SAS tenham de dar mais respostas no próximo ano", frisa António Alves. Enquanto o presidente da associação da UBI sublinha a perversão de o sistema de apoio "ser financiado pelos estudantes" através dos gastos nos serviços. "O Estado não pode desresponsabilizar-se", insiste.
Dados
53% dos estudantes responderam no inquérito que os seus agregados familiares perderam rendimentos desde o início da pandemia. A maioria são bolseiros. Entre os deslocados, 63% têm dificuldades em pagar o alojamento.
195 bolsas: "entre março e o final de junho, foram submetidas e processadas 141 novas candidaturas a bolsa" e "outros 54 estudantes recorreram aos auxílios de emergência", revelou o ministro Manuel Heitor.
Mais bolsas
Um novo limiar de elegibilidade vai vigorar no acesso às bolsas, passando de 16 para 18 vezes o indexante de apoios sociais (IAS). A mudança permitirá abranger mais 9000 estudantes.
Nova regra
Aprovada no Orçamento Suplementar, a norma permitirá aos estudantes anexar não só o IRS de 2019 mas também os rendimentos dos últimos 12 meses, de forma a provar perda de rendimentos.
Menos propinas
Parlamento aprovou nova redução de 20% nas propinas, reduzindo de 871 para 697 euros.
A saber
Mais de 51 mil vagas
As candidaturas ao Ensino Superior já arrancaram. Os estudantes, através do concurso nacional de acesso, terão 51 498 vagas. A primeira fase decorre até 23 de agosto e as colocações são divulgadas a 28 de setembro.
Solução para o litoral
A distância mínima de dois metros entre camas vai cortar o número de vagas nas residências no próximo ano letivo. A rede privada será a alternativa. O Governo está a negociar com a associação de hostels e com a Movijovem, que gere as pousadas de juventude, mais quartos para os estudantes deslocados em Lisboa, Porto, Braga e Coimbra. Os presidentes das associações da UBI e UTAD criticam a solução que só serve os grandes centros urbanos.