O encerramento de cerca de 25% das universidades seniores, desde a declaração do primeiro estado de emergência, em março, provocou um aumento de ansiedade, depressão, solidão e isolamento dos idosos.
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A garantia é dada por Luís Jacob, presidente da Rutis - Rede de Universidades Seniores, que tem incentivado estes espaços a reabrirem ou a manterem atividades online.
"Temos relatos de pessoas que encontram alunos na rua que não as reconheceram porque estão há muitos meses em casa", assegura Luís Jacob. Defende, por isso, que as universidades seniores devem, pelo menos, manter contacto com os alunos através da internet, apesar de ter consciência que nem todos os alunos sabem usar o computador.
De um universo de 62 mil alunos, 40 mil não estão a ter aulas
Até ao momento, o presidente da Rutis diz que apenas 10% estão a interagir com os idosos através do Facebook ou a partilhar aulas gravadas. "De um universo de 62 mil alunos, 40 mil não estão a ter aulas", revela. Ou porque as universidades fecharam ou porque os idosos têm medo da pandemia. "A falta de convívio e de atenção afetou muito os alunos", garante.
O Instituto Sénior da Foz (ISF), no Porto, reabriu em setembro, mas cerca de 20% dos alunos não regressaram. No entanto, continuam a ter acesso às aulas por email, como sucedeu nos seis meses em que o ISF esteve fechado. A diretora, Isménia Boggio, diz que, nesse período, os estudantes manifestaram ansiedade e solidão.
"Está a ver as pessoas sentadas à frente da televisão a ver o número de casos de covid? O impacto ainda se vai sentir mais, depois disto tudo passar", acredita. Como a faixa etária dos alunos é superior a 75 anos, Isménia Boggio diz que o ISF é uma motivação para saírem de casa e conviverem.
Problemas de saúde mental
No ano passado, a Universidade Sénior da Nazaré (USN) era a instituição com mais alunos do país: 468. Contudo, iniciou este ano letivo, em novembro, com menos devido à pandemia. As aulas são presenciais e através do Facebook, tal como durante os oito meses em que esteve fechada, já que mais de metade dos alunos usava esta rede social. "Gravávamos vídeos e fazíamos diretos todos os dias para não se sentiram abandonados", explica a coordenadora, Filipa Lopes.
Sentimos as pessoas muito deprimidas, porque em casa estavam sempre a ser bombardeadas com a covid
Os idosos sem computador eram acompanhados por telefone ou através de visitas. "Mesmo assim, sentimos as pessoas muito deprimidas, porque em casa estavam sempre a ser bombardeadas com a covid", justifica Filipa Lopes.
"Houve um boom de problemas de saúde mental", assegura. Com mais de 60 anos, os alunos da USN passaram a ter um objetivo na vida. "Sem suporte familiar, ganharam gosto pela universidade, porque querem voltar a ser reconhecidos pela sociedade, a interagir e a ter um papel ativo na comunidade".
"Sentem muito medo"
Frequentada por 273 alunos, a Academia Sénior de Penamacor está fechada desde março. "Trabalhamos com um grupo de risco e consideramos que a saúde está em primeiro lugar", justifica Teresa Magalhães, diretora adjunta da Adraces, que dinamiza a academia. Apesar de as técnicas da Autarquia manterem contacto com os alunos mais isolados e terem gravado vídeos a ensinar exercícios físicos, Teresa diz que os idosos "andam deprimidos e sentem muito medo".
António Espanhol nunca faltou a uma aula
António Espanhol tem 85 anos, e nunca falta a uma única aula da Universidade Sénior da Nazaré (USN). Aluno desde 2013, juntou a essa condição a de professor de Danças do Povo, pouco tempo depois. Este ano, as aulas foram suspensas durante oito meses devido à pandemia. Diz que engordou "mais um bocadinho" e que sente dores nas pernas, por ter deixado de praticar exercício regular.
Viúvo há sete anos, António conta que os três meses que esteve sem sair de casa lhe agravaram o problema de circulação nas pernas e que, por vezes, se sentia aborrecido, sobretudo à noite. A televisão e a arrumação de papéis ajudaram-no a ocupar o tempo e, mesmo à distância, os filhos iam-lhe dando apoio. As compras eram asseguradas pelo mais velho.
Mestre em redes sociais
Quando o primeiro estado de emergência terminou, António retomou algumas rotinas. "Não me sentia triste porque almoço fora todos os dias, onde tenho pessoas conhecidas, com as quais converso", explica ao JN. Mas o que lhe fazia mesmo falta eram as aulas na USN, que antes lhe ocupavam seis a sete horas do dia. Fora o tempo que investia a preparar, em casa, as coreografias de Danças do Povo.
Utilizador diário das novas tecnologias, movimenta-se com mestria nas redes sociais, ao ponto de esclarecer dúvidas aos mais novos. É no Facebook que investiga danças folclóricas portuguesas, de diferentes pontos do país, cujos passos adapta a novas coreografias, para ensinar aos cerca de 70 alunos da USN. "Posso agradecer à escola ter aprendido a mexer no computador", diz, reconhecido.
Além de ter aulas de Informática, António inscreveu-se na tuna, em Jornalismo e em Psicologia. "Temos de saber lidar com os alunos, se não, levam a mal e não vão às aulas. Às vezes, temos de ser um bocadinho psicólogos", confessa. Como professor leva o seu papel muito a sério, ao ponto de ligar aos alunos quando faltam. "Não sou muito exigente, mas exigente. Quando me dizem isso, costumo responder: "Se não fosse, vocês dançavam desta maneira?" E eles dão-me razão."
A Universidade Sénior da Nazaré reabriu a 17 de novembro e António Espanhol pôde regressar finalmente às aulas, mas as de Danças do Povo, de Teatro e a tuna continuam suspensas devido à covid-19.