Medida anunciada pela ministra da Saúde para responder aos constrangimentos do fim de semana. Temido admite ainda contratar "todos os especialistas que aceitem ser contratados".
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Criar um plano de contingência para os meses de verão, com uma maior articulação dentro do Serviço Nacional de Saúde (SNS), contratar "todos os especialista que queiram ser contratados" e monitorizar os indicadores de saúde materna. Estas são três das medidas apresentadas ontem pela ministra da Saúde para responder à crise das urgências. Marta Temido anunciou um plano a dois tempos e voltou a frisar que "a situação não é nova". As declarações de Marta Temido surgiram após três dias de constrangimentos em várias urgências de obstetrícia do país. Algumas fecharam portas, outras funcionaram a meio-gás. A região de Lisboa e Vale do Tejo foi a mais afetada.
"Sabemos que, não sendo de hoje, estes problemas estão num momento mais agudo, depois de dois anos de pandemia e de um adiar de um conjunto de medidas que queríamos ter implementado anteriormente e que não foram possíveis de ser implementadas", referiu a ministra da Saúde, "falando numa situação com outra gravidade" e que se prende "com constrangimentos nas organizações de escalas de urgência externa de ginecologia e obstetrícia".
Para fazer face à situação, Marta Temido anunciou um "plano de contingência para junho, julho, agosto e setembro", com "o funcionamento mais articulado e antecipado das urgências do SNS". Poderá abranger, admitiu a ministra, as "questões remuneratórias associadas". Será ainda feita uma "monitorização dos indicadores de saúde materna" para que "a instabilidade que se instalou não se sobreponha àquilo que é o valor da confiança num serviço público".
Plano a médio prazo
Depois, Temido falou ainda "num plano de médio prazo" com um "olhar para a formação de recursos na obstetrícia" e para a contratação de novos médicos. A ministra da Saúde admitiu a "contratação de todos os especialistas que aceitem ser contratados pelo SNS".
"Infelizmente, não temos para contratar tantos recém-especialistas quanto gostaríamos", referiu Marta Temido que, ontem, esteve reunida com a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (LVT), com os diretores de ginecologia e obstetrícia e com os diretores clínicos dos hospitais da região de LVT. Foram ainda ouvidos a Ordem dos Médicos e os sindicatos.
alterar decreto
Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, considerou a reunião "positiva" e afirmou que a tutela mostrou recetividade às sugestões feitas pela Ordem. Entre as propostas para curto prazo está a alteração do despacho de 2011 que impede os hospitais de contratarem os seus médicos em regime de prestação de serviço quando esgotam as horas extraordinárias. Miguel Guimarães defende que os hospitais possam contratar os seus profissionais, sendo-lhes pago o mesmo que recebem os prestadores de serviços.
"Muito do serviço de urgência na área de obstetrícia é assegurado por médicos que trabalham para empresas prestadoras de serviços e que, nesta altura, não estão disponíveis e daí a grande dificuldades que as ARS [administrações regionais de saúde] têm em organizar as suas equipas.
Já o Sindicato Independente dos Médicos (SIM) e a Federação Nacional dos Médicos (FNAM) lamentaram a falta de "propostas objetivas" por parte do Governo durante a reunião. "Penso que a senhora ministra da Saúde não tem a noção da gravidade daquilo que está a ocorrer nos serviços de obstetrícia", criticou Roque da Cunha, do SIM.
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Hospital de Braga tenta evitar encerramento
O Hospital de Braga está a "envidar todos os esforços" para preencher as escalas das urgências de Ginecologia e Obstetrícia e, assim, evitar um possível novo encerramento temporário do serviço na sexta-feira e no domingo. Recorde-se que, no domingo, as urgências de Ginecologia e Obstetrícia estiveram fechadas durante 24 horas, devido à "impossibilidade de completar escalas".
S. Francisco Xavier e Barreiro fecharam
As urgências de Ginecologia e Obstetrícia dos hospitais São Francisco Xavier, em Lisboa, e do Barreiro estiveram fechadas entre as 20 horas de ontem e as 8 horas de hoje, obrigando ao encaminhamento de grávidas para outras unidades. Segundo a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), até ao final do dia de ontem, houve ainda "períodos em que alguns hospitais funcionaram com limitações".
Hospitais em rede com 192 partos
Segundo a ARSLVT, entre sexta-feira e domingo, nas maternidades da região, foram realizados 192 partos. Para a entidade, os números atestam "o funcionamento em rede das unidades do SNS".
Portugal tem obstetras, mas falta fixar profissionais no setor público
Federação teme que a situação verificada em alguns hospitais no fim de semana se agrave
Portugal está em linha com a Europa no número de obstetras formados, mas há "uma dificuldade em fixar" os médicos no Serviço Nacional de Saúde (SNS). A afirmação é feita por Diogo Ayres de Campos, presidente da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia, que teme um possível agravamento da situação, verificada em algumas urgências no fim de semana, com o aproximar das férias dos profissionais e com o atingir do limite máximo de horas extra fixados por lei.
"Os nossos números de obstetras estão, mais ou menos, na mesma ordem de grandeza da maioria da Europa. Há, de facto, uma dificuldade em fixar os médicos obstetras no SNS", adverte Diogo Ayres de Campos, frisando, ainda, que "a medicina privada cresceu muito nesta área e tornou-se mais atraente para jovens obstetras do que a medicina pública, em termos financeiros, de instalações e de condições de trabalho".
O encerramento de algumas urgências de obstetrícia no fim de semana, segundo Diogo Ayres de Campos, criou "períodos extremamente complicados nos hospitais abertos", principalmente em termos de espaço. O responsável teme que a situação se possa agravar. "Ao contrário dos anos anteriores, onde havia situações destas, mas eram mais pontuais, este ano, as contingências começaram antes das férias e há hospitais que, todas as semanas, têm dois ou três dias de contingência".