"Verdadeiro dia da liberdade" ou "esvaziamento" de Abril? Partidos disputam legado do 25 de Novembro
O Parlamento assinala os 49 anos do 25 de Novembro, com uma sessão solene. Vários parlamentares de Esquerda, entre eles Pedro Nuno Santos, usam cravos ao peito. O PCP, recorde-se, recusou estar presente, com o BE a fazer-se representar por apenas uma deputada. Acompanhe aqui os discursos dos partidos políticos.
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Pelo PSD, o vice-presidente da bancada, Miguel Guimarães, defendeu que o 25 de Novembro "simboliza o triunfo da moderação sobre o extremismo", referindo que a data deve unir e não dividir o Parlamento: "O 25 de Novembro cumpriu Abril", afirmou.
O social-democrata considerou que Novembro impediu que o país se tornasse "uma democracia popular de inspiração marxista". Citou o general Ramalho Eanes, dizendo não compreender como pode haver quem "estigmatize" um dia que é a "continuação" de Abril. Elogiou o papel do general durante o 25 de Novembro e este, presente nas galerias, agradeceu o cumprimento.
Miguel Guimarães ressalvou que "comemorar o 25 de Novembro não é apoucar ou tentar diminuir o 25 de Abril", considerando que isso seria "absurdo e condenado ao fracasso". Argumentou ainda que a liberdade, o pluralismo político e a propriedade privada só ficaram "salvaguardados" com Novembro.
PS critica os que querem quebrar a "concórdia nacional" para ter "ganhos efémeros"
Pedro Delgado Alves, do PS, começou por citar Mário Soares, lembrando que, embora o líder histórico socialista considerasse que Novembro foi um "ponto de viragem" contra o "abismo", sempre procurou promover a "união". A este propósito, Delgado Alves - que discursou de cravo vermelho ao peito - criticou os que tentam "instrumentalizar ou reescrever o passado" e promover a "quebra da concórdia nacional" para obter "ganhos efémeros".
Tal como Miguel Guimarães, também Delgado Alves saudou e citou Eanes (este agradeceu), embora para realçar o facto de o general ter dito, no passado, que o 25 de Abril é que é o dia "fundador". O socialista frisou ainda que Novembro "impediu as tentações revanchistas da Direita radical", numa alusão aos setores que desejavam ilegalizar o PCP e que fazem, "inequivocamente, parte dos derrotados".
Delgado Alves criticou os que, "artificialmente", querem dar ao 25 de Novembro "a mesma dignidade" institucional do 25 de Abril. Lembrando que nem a proclamação da República nem a restauração da independência têm as honras parlamentares agora concedidas ao 25 de Novembro, rematou: "Não viremos Novembro contra Abril, porque Novembro não foi feito contra Abril".
"Este é o verdadeiro dia da liberdade", diz Chega. IL contra "wokismos" e "nacionalismos"
André Ventura, do Chega, lembrou que, em 1975, havia "ocupação de terras, destruição de empresas" e "medo da guerra civil". Considerando que o país estava "sem rei nem roque" e "caminhava para uma ditadura soviética", atirou: "Sem esquecermos o 25 de Abril, este é o verdadeiro dia da liberdade".
O deputado citou por duas vezes Ramalho Eanes: primeiro para concordar que "Abril ofereceu-nos a liberdade, mas esqueceu-se de criar cidadãos"; depois, para referir que a democracia portuguesa está limitada às "elites". "Tanta razão", afirmou Ventura. Os deputados do Chega aplaudiram Eanes de pé mas, ao contrário do que ocorrera nos discursos de PSD e PS, o general manteve-se impassível.
O líder do partido falou ainda de "novas ameaças", como a "imigração descontrolada", a violência nos bairros periféricos ou a "corrupção que Abril criou". Alguns deputados do PS saíram da sala quando Ventura, sem citar quaisquer dados, traçou uma relação entre imigração e violações de mulheres.
Rui Rocha, da IL, procurou responder aos que dizem que o 25 de Novembro não é uma data "consensual": concordou com eles para lembrar que Ramalho Eanes e Mário Soares, dois protagonistas desse acontecimento, "não procuraram consensos com quem não defendia a liberdade". O liberal descreveu esse dia como "a derrota dos totalitários" e um "momento decisivo para a afirmação da democracia".
Rui Rocha lembrou os tempos de "perseguições políticas, prisões arbitrárias, censura" ou "agressão à propriedade", argumentando que, em 1975, o país estava perto de uma "nova ditadura instalada". Fazendo a ponte para o presente, acusou tanto a Esquerda como o Chega (sem nomear) de "derivas totalitárias" - os primeiros por promoverem o "wokismo", os segundos devido a "nacionalismos exacerbados" e "protecionismos" na economia.
BE diz que sessão solene é "disparate", Livre fala em "usurpação e aproveitamento"
Joana Mortágua, do BE, descreveu a sessão solene como um "disparate" ao qual a Esquerda porá fim quando tiver maioria. De cravo vermelho ao peito, considerou que esta comemoração é uma "manobra dos derrotados de Abril", acusando-os de quererem "esvaziar" o "conteúdo revolucionário e popular" desse processo.
A bloquista realçou que o direito ao voto ou o pluralismo partidário "nasceu com o 25 de Abril" e não com Novembro. Acusou a Direita de "inventar um passado alternativo" e uma "lenda", criticando a "deplorável disponibilidade do PSD para ceder às extremas-direitas".
Filipa Pinto, do Livre, sustentou que a guerra civil foi evitada "não pela mão dos herdeiros do fascismo" mas sim por "quem nos trouxe a liberdade". Garantindo que tem "respeito" pelo 25 de Novembro, acusou a Direita de "usurpação e aproveitamento" desta data, afirmando que os partidos em causa vão contra a "verdade histórica" e a "importância fundadora" do 25 de Abril.
A parlamentar do Livre lembrou que não foi o 25 de Novembro que garantiu o voto universal, uma vez que este já tinha sido assegurado logo em novembro 1974. Lembrando que 25 de novembro é, também, o Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, Filipa Pinto recordou que, só este ano, já morreram 25 mulheres às mãos dos maridos e companheiros. Recebeu palmas da bancada do PS.
Paulo Núncio, do CDS, considerou que, no período entre o 25 de Abril de 1974 e o 25 de Novembro de 1975, "o PCP, a extrema-esquerda e os seus braços armados" tentaram "apropriar-se" da Revolução. "Com o 25 de Abril ganhámos a liberdade, com o 25 de Novembro evitámos que a liberdade se perdesse", referiu.
Inês, Sousa Real, do PAN - que levou consigo um cravo para o palanque -, referiu que foi com Novembro que Portugal "seguiu definitivamente o rumo da democracia pluralista". Contudo, considerou que "é no 25 de Abril que deve decorrer a celebração de todos os momentos marcantes da Revolução".