Vítimas de violência doméstica recebem subsídio de 166 euros para mudar de casa
Subsídio para ajudar a reestruturar a vida foi criado em 2020. Associações dizem que a duração da licença e o valor são "insuficientes".
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Quase meio milhar de vítimas de violência doméstica recorreu à licença e ao subsídio estatal destinado a apoiar a mudança de casa e a reestruturação da vida familiar. A ajuda, que entrou em vigor no final de novembro de 2020, foi requerida por 452 mulheres e 11 homens, num total de 463 pessoas. A maioria tem entre 35 e 55 anos. O Instituto da Segurança Social dá conta de que os pedidos de apoio abrangem todo o território nacional, com uma maior incidência na Região Norte (37%) e em Lisboa e Vale do Tejo (31%). As associações que acompanham as vítimas defendem o aumento dos dias de licença e do valor mínimo pago. O montante médio do subsídio ronda os 166 euros.
Denominado "Licença e subsídio de reestruturação familiar", o apoio do Estado tem de ser solicitado por vítimas de violência doméstica a quem tenha sido reconhecido o estatuto e que sejam "obrigadas a sair da sua residência". Prevê uma licença de dez dias e um apoio financeiro que varia consoante os rendimentos do requerente. O valor mínimo diário é de 14,77 euros (ler Saber Mais).
De acordo com a Segurança Social, entre os requerimentos deferidos até então, verifica-se um valor médio pago de cerca de 166 euros. Até à data, recorreram ao subsídio 463 pessoas: 29 em 2021 e 434 já este ano. "O procedimento de reconhecimento do direito, a atribuição e o pagamento do subsídio de reestruturação familiar têm natureza urgente, pelo que os serviços, desde que o requerimento esteja devidamente instruído, diligenciam desde logo no tratamento e decisão do mesmo", garante a Segurança Social ao JN.
Pouco tempo para mudar
Embora afirme ser "muito importante" a existência desta licença, Ilda Afonso, da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), entende que os 10 dias concedidos, bem como o montante mínimo pago por dia são "insuficientes". Pede, por isso, "um valor mais justo" e uma "maior duração" da licença. "Ninguém se reorganiza em 10 dias e o valor [mínimo] é irrisório", frisa.
Também Daniel Cotrim, psicólogo e assessor técnico da Direção da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), considera que a duração da licença e o subsídio mínimo atribuído são "muito curtos. Não é um tipo de instrumento a que recorramos muitas vezes. Informamos da existência do mesmo e do que é necessário para o solicitar, mas, na maioria das vezes, não fazemos uso dele", explicou o responsável da APAV, detalhando que, nos casos em que a vítima tem de mudar de região e ir para uma casa abrigo, optam, por vezes, pela "rescisão amigável dos contratos e pela entrega da documentação para solicitar o subsídio de desemprego". Ainda assim, Daniel Cotrim crê que "tudo o que seja para ajudar as vítimas é importante".
Já Sofia Cabral Lopes, advogada e vogal da Direção da Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, defende que a informação sobre o apoio deve constar nos documentos apresentados às vítimas pelos órgãos de polícia criminal, para que homens e mulheres tenham conhecimento desta ajuda.
À lupa
28 mulheres foram mortas este ano, vítimas de violência doméstica, de acordo com o observatório de mulheres assassinadas da UMAR. O ano de 2022 está a ser negro, registando já mais 15 vítimas de femicídio do que em 2021.
74% das vítimas que pediram o apoio do Estado para reestruturar a vida familiar têm entre 35 e 55 anos. Cerca de 37% residem no Norte e 31% na região de Lisboa e Vale do Tejo.
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A quem se destina?
A licença e o subsídio de reestruturação familiar destinam--se a vítimas de violência doméstica, a quem tenha sido reconhecido o estatuto de vítima e que sejam obrigadas a abandonar o lar. Segundo a lei, a licença tem a duração máxima de 10 dias. O apoio tem de ser requerido pela vítima, junto do Instituto de Segurança Social.
Qual o valor a receber?
O montante diário a receber varia consoante os rendimentos do requerente. Caso seja trabalhador por conta de outrem ou em exercício de funções públicas, o apoio é calculado de acordo com "a remuneração-base líquida auferida no mês anterior à apresentação de requerimento". Já para trabalhadores independentes, o montante do subsídio tem por base "o rendimento relevante apurado na última declaração trimestral". Para "profissionais não abrangidos pelo sistema de proteção social da Segurança Social" ou sem vínculo laboral, a verba diária é calculada com base "no valor do indexante dos apoios sociais". É, no mínimo, de 14,77 euros por dia.
Como requerer?
A atribuição do subsídio depende da apresentação de um requerimento, cujo formulário está disponível no site da Segurança Social. Deverá ser acompanhado, entre outros documentos, por uma "cópia do estatuto de vítima de violência doméstica".