Recenseamento automático quase quintuplica inscritos. Comunidades pedem voto eletrónico e já pensam em eleger mais deputados.
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Foi aberta a caixa de Pandora. Com a entrada em vigor do recenseamento automático dos portugueses residentes no estrangeiro, o Governo estima que entrem para os cadernos eleitorais da emigração mais 1,5 milhões de novos eleitores. O que leva as comunidades portuguesas a reclamar mais voz. Para já, a luta vai centrar-se na instituição do voto eletrónico. No futuro, os esforços vão centrar-se na conquista de mais deputados. Um sonho, porém, difícil de alcançar, pois obriga não só a uma alteração da Lei Eleitoral, mas sobretudo da Constituição da República Portuguesa.
"Estamos contentes com este primeiro passo", afirma António Cunha, conselheiro da comunidade portuguesa no Reino Unido que, há dois anos, impulsionou uma petição precisamente para que fosse instituído, também para a emigração, o recenseamento automático aquando da emissão do cartão de cidadão. "Era um combate de décadas, uma questão de igualdade", acrescenta Pedro Rupio, representante da comunidade portuguesa na Bélgica.
"É a mais importante mudança na qualificação da cidadania no estrangeiro", concorda o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Luís Carneiro, satisfeito com uma medida que vai quintuplicar o número de inscritos nos dois círculos da emigração.
"Com esta mudança, passar-se-á dos atuais 314 862 cidadãos recenseados no estrangeiro para mais 1,5 milhões", estima José Luís Carneiro. "São 1,5 milhões de novos eleitores", acentua a secretária de Estado da Administração Interna, Isabel Oneto, que vai notificar todos os emigrantes do seu recenseamento automático.
Quase dois milhões
Caso todos aceitem permanecer, os círculos da Europa e de fora da Europa passarão a ter cerca de 1,8 milhões de eleitores, o que leva as comunidades portuguesas a sonhar em conquistar mais voz. A batalha mais imediata será levar os emigrantes a votar. Nas legislativas, registaram-se 28 mil votos em 314 mil eleitores. Para reduzir a abstenção, o Governo já iniciou ações de informação e reforçou o número de consulados com poderes para ter mesas eleitorais. "Temos vindo a capacitar a rede para que esteja operacional", garante José Luís Carneiro.
Mas, para as comunidades, isso não chega. "É preciso avançar com o voto eletrónico", exigem António Cunha e Pedro Rupio, lembrando que, ainda assim, há milhares de emigrantes que vivem a horas de distância dos consulados.
No futuro, a batalha passará pela proporcionalidade. "Não iremos pedir para eleger dez deputados. Queremos uma representatividade mais justa", diz Pedro Rupio, referindo que o recenseamento automático também vai "emagrecer" os cadernos nacionais.
"É a própria Constituição que retira o princípio da proporcionalidade dos círculos da emigração", aponta, contudo, Isabel Oneto. Ou seja, teria que ser feita uma revisão constitucional. "Temos que ganhar voz para exigirmos isso", vinca António Cunha.
Pormenores
Petição juntou 4500
Há dois anos, o movimento "Também somos portugueses", no Reino Unido, promoveu uma petição que juntou cerca de 4500 assinaturas a defender o recenseamento eleitoral automático aquando da emissão do cartão de cidadão. A petição forçou o debate na Assembleia da República.
Proposta de lei de 2017
Em abril de 2017, foi aprovada em Conselho de Ministros uma proposta de lei que instituía o recenseamento automático para a emigração. A iniciativa foi enviada para discussão no Parlamento.
Aprovação no Parlamento
Em julho passado, a Assembleia da República aprovou o recenseamento automático. Também foram introduzidas alterações no voto por via postal que, com o porte pago, passa a ser gratuito. Além disso, os cidadãos com dupla nacionalidade vão poder candidatar-se ao Parlamento, mesmo que residam no estrangeiro e desde que não estejam a exercer um cargo similar.
Emigrantes notificados
As alterações à lei entraram em vigor a 14 de agosto. Até 12 de novembro, a Administração Interna vai notificar os cidadãos portugueses residentes no estrangeiro sobre a sua inscrição automática na comissão recenseadora da área da residência constante no cartão de cidadão.
30 dias para recusar
Caso não aceitem a inscrição automática, os emigrantes terão 30 dias para manifestar a sua oposição. Já quem ainda possui bilhete de identidade tem que pedir a inscrição nos cadernos eleitorais.
