A falta de professores é sentida nas escolas das regiões de Lisboa, Algarve e Alentejo de forma transversal desde o 2.º Ciclo.
Corpo do artigo
Os diretores têm cada vez mais dificuldade em substituir professores de baixa e há casos de turmas sem um dos professores desde o primeiro período, garantem o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), Filinto Lima, e o secretário-geral da Federação Nacional de Professores (Fenprof), Mário Nogueira.
Inglês, Matemática, História, Geografia ou Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) são grupos de recrutamento com reservas "vazias ou quase vazias".
O Ministério da Educação assume a sinalização de maiores dificuldades na substituição de docentes e sublinha que, por esse motivo, tem autorizado horas extraordinárias para mitigar faltas.
A Secundária de Bocage, em Setúbal, é um dos casos. Em agosto, uma professora com gravidez de risco foi colocada num horário completo para Geografia (seis turmas do 3.º Ciclo). "Nem foi à escola. Só consegui professor em dezembro, mesmo antes das férias", conta o diretor Pedro Tilde, que chegou a assumir uma das turmas por ter horário compatível.
Neste momento, conta, desde o início de fevereiro duas turmas do 12.º ano estão sem professor de Matemática. O horário não foi preenchido nem nas reservas de recrutamento nacionais, nem na contratação de escola. "Ainda não consegui candidatos, nem vou ter", assume o diretor. A partir do 3.º período, vai mudar um professor que dá aulas a uma turma de 10.º e de 8.º para que os de 12.ºº, que têm exame, possam recuperar matéria. Os outros devem ficar sem aulas.
A falta de professores, garante Filinto Lima, foi uma das principais preocupações expressas pelos diretores nas reuniões que a Andaep promoveu com diretores de Lisboa, Algarve e Alentejo. No Norte e Centro do país há maior concentração de professores e o problema ainda não se sente.
"Ainda não se sente mas vai sentir", assegura Mário Nogueira, apontando como causas o envelhecimento da classe, a delapidação da carreira e cursos superiores desertos. Este é um problema que se tem vindo a agravar de forma progressiva nos últimos dois anos "e vai atingir extrema gravidade daqui a quatro anos" com a saída de, pelo menos, 11 mil professores para a aposentação até 2023.
2530 HORÁRIOS RECUSADOS
Mesmo quando há candidatos, há cada vez mais docentes que recusam horários por causa do preço das casas em Lisboa e no Algarve. "Há diretores que têm de ser agentes imobiliários e ter uma lista de casas" pronta para enviar aos colocados, descreve Filinto Lima. Segundo o ME, desde 7 de setembro até final de janeiro foram recusados 2530 horários.
"Se um horário não fica preenchido em agosto, na contratação inicial fico logo nervoso", diz José António Sousa, diretor da Secundária D. Dinis, em Lisboa. E conta um caso: em setembro, o lugar para TIC ficou por preencher e ficou sem candidatos todo o primeiro período. Conseguiu autorização, desde janeiro, para atribuir horas extraordinárias e os alunos passarem a ter aulas. Neste momento, tem duas turmas de 3.º Ciclo sem aulas de Física e Química há dois meses.
O salário de um professor contratado ronda os mil euros. Se a substituição for de um docente mais velho, com redução letiva, o horário cai facilmente para as 16 horas letivas e o salário para os 800 euros líquidos, explica Nogueira. "O custo das deslocações faz com que os professores tenham de pagar para trabalhar".
Saber mais
12 mil têm mais de 60 anos - De acordo com o último relatório Estado da Educação, quase metade dos professores têm mais de 50 anos e, destes, 12 mil têm mais de 60 anos. Só 582 têm menos de 30 anos. O Conselho Nacional de Educação pediu ao Governo um plano para o rejuvenescimento da classe com urgência.
Menos 30% de candidatos - O curso de Educação Básica no Politécnico de Portalegre recebeu um aluno após as três fases do concurso nacional de acesso. Para o da Guarda não concorreu ninguém. Só este ano o número de candidatos diminuiu 30%.
Mais de 10 mil desistiram - A Fenprof estima que desde 2012 entre dez a 12 mil professores deixaram de concorrer aos concursos e tenham desistido da profissão. Na última década saíram ainda do sistema de ensino mais de 30 mil docentes.