No último ano, mais de dois mil motoristas de transporte rodoviário de mercadorias brasileiros e cerca de mil venezuelanos começaram a trabalhar em Portugal.
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Os patrões estimam que faltem cerca de cinco mil profissionais no setor. A falta de camionistas é de tal forma grave que há transportadoras que estão a oferecer bónus de 150 euros a quem indicar o nome de homens ou mulheres com carta de pesados. No Brasil, há empresas que fazem lá o recrutamento.
Ao aeroporto de Lisboa, chegaram há dias 30 camionistas brasileiros, já com contrato de trabalho recrutados por uma das maiores transportadoras nacionais. Outros vêm por iniciativa própria e, já em Portugal, as empresas tratam da legalização. Com os oriundos da Venezuela, o percurso é diferente. "Normalmente, entram por Espanha por causa de fazerem parte da América Latina, facilitando a autorização de viajar, e depois passam para Portugal", explicou um elemento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
"É o caos. As empresas dizem que não podem aumentar os salários, um motorista que emigre para a Inglaterra ou a Irlanda, por exemplo, vai ganhar o triplo do que ganha cá e, na verdade, também há um grande aumento no número de empresas e no volume das mercadorias transportadas por terra", disse ao JN Frederico Sousa, motorista internacional e membro da Direção da Associação Profissionais ao Volante.
A Associação Nacional de Transporte de Mercadorias (ANTRAM), que representa os empresários do setor, confirma a crise: "Consciente de que um dos grandes problemas do setor é a contratação e a manutenção de motoristas, as empresas viram-se obrigadas a recorrer à contratação de profissionais estrangeiros".
Salário pode chegar aos 1500€
O salário-base é de 630 euros, a que acrescem vários subsídios e ajudas de custo, dependendo se o motorista trabalha apenas em Portugal, se faz a Península Ibérica, é internacional ou transporta mercadorias perigosas. Há, ainda, os que ganham ao quilómetro e os que têm salário fixo, combinado com a entidade patronal.
"Em média, cada camionista recebe mensalmente cerca de 1500 euros", afirmou Márcio Lopes, presidente da Associação Nacional das Transportadoras Portuguesas. E continua: "A falta de motoristas é um problema gravíssimo e, neste momento, precisamos, no mínimo de mais cinco mil motoristas para começar de imediato".
O representante dos patrões defende que "não é necessário um contrato coletivo de trabalho" porque, perante a falta de profissionais, "os camionistas ganham o salário que querem e negoceiam diretamente com as empresas". De acordo com a ANTRAM, mais de metade dos motoristas tem mais de 50 anos e irão, em breve, aposentar-se. "O setor dos transportes não tem tido sucesso no que respeita ao recrutamento de jovens devido à imagem negativa do setor", admite fonte da associação.
"Não foi fácil chegar a Portugal, mas valeu a pena"
Erico Brito da Silva, 45 anos, natural do Rio Grande do Sul, no Brasil, e a mulher, Bárbara Santos, também brasileira, são ambos motoristas e mudaram-se para Penafiel para trabalhar numa empresa portuguesa.
"Não foi fácil chegar a Portugal e conseguir estabilidade, mas agora está tudo bem", disse ao JN Erico. O casal tem casa em Penafiel, mas passa a maior parte do tempo na estrada entre Portugal e a Alemanha. "Vivemos bem, trabalhamos muito, mas vivemos muito bem", frisou Bárbara.
A carta de pesados foi tirada no Brasil e, já em Portugal, obtiveram a carta de qualificação de motorista. "Nunca me arrependi de ter vindo para Portugal e tenho a noção de que a minha vida seria muito, muito pior no Brasil", afirmou Erico, que está "encantado" com a prestação de cuidados de saúde e com a educação que encontrou no país que o acolheu. "Se os portugueses vissem como funciona o Brasil, não se queixavam de nada".
O casal só quer voltar ao Brasil de férias "e por pouco tempo", afirmou Bárbara. "Os brasileiros que estão a pensar vir trabalhar como motoristas em Portugal que não pensem que vai ser tudo fácil porque não vai. Mas, passando os primeiros meses, tudo compensa".
A autorização nacional para conduzir demora, no mínimo, três meses. Durante esse tempo, se não tiverem já contrato de trabalho com uma empresa que lhes pague as despesas, é preciso ter dinheiro, no mínimo, para pagar a renda de casa e a alimentação. "Quando começamos a trabalhar certinho, tudo é mais fácil porque o custo de vida aqui é mais barato e o país é muito mais seguro a todos os níveis", salientou Erico.
O casal negociou diretamente o vencimento com a entidade patronal, auferindo um salário fixo que não depende de subsídios ou dos quilómetros percorridos. "Assim, sabemos sempre com que dinheiro que podemos contar e organizamos a nossa vida em função desse valor", sintetiza Erico.