
Nuno Simões de Melo e Mariana Nina estão entre os 14 militantes que criticam o rumo do partido, liderado por Rui Rocha
LUSA
Perda da identidade e as recentes decisões do grupo parlamentar levam à desfiliação de 14 membros da Iniciativa Liberal. Dois integram o conselho nacional.
São 14 os membros da "ala da Direita liberal" que decidiram deixar a Iniciativa Liberal (IL), dois dos quais são membros do conselho nacional do partido desde janeiro. A perda dos valores e da identidade liberal e as decisões tomadas, recentemente, pela bancada parlamentar, que, frisam, coloca o rumo do partido à Esquerda, estão entre as razões que ditam a desvinculação. Os núcleos territoriais da Maia (terceira estrutura local com mais peso no partido, depois da de Lisboa e do Porto) e de Famalicão perdem os seus coordenadores, sendo necessária a realização de eleições. E mais militantes podem bater com a porta.
O manifesto de saída dos 14 militantes da IL, a que o JN teve acesso em primeira mão, será entregue no dia 25 à meia-noite. Nuno Simões de Melo, considerado o rosto dos "liberais clássicos" nas últimas eleições internas - encabeçando a lista que elegeu quatro representantes para o conselho nacional - é um dos subscritores da missiva. "Não posso continuar a branquear um caminho com o qual não concordo, ao permanecer no partido. Não me revejo na estratégia, na política, nem na liderança".
Caminho à esquerda
Para o liberal filiado há dois anos, mais grave do que a "oposição interna" não ter peso no órgão nacional é o facto do partido "hipotecar as ideias liberais".
"Com o caminho que a IL está a fazer em direção à Esquerda, cada vez mais entre o PS e o Livre, receio que os portugueses não compreendam aquilo que o liberalismo tem de bom, que é a liberdade individual, com um Estado fora da vida dos cidadãos e preocupado com as funções de soberania", exemplifica ainda.
"Temos assistido a uma erosão, ao longo do tempo, do próprio agendamento político da IL. As propostas do grupo parlamentar não revelam nem espalham a verdadeira luta e preocupação dos portugueses. São poucas as propostas à qualidade de vida dos portugueses, à proteção dos pequenos empresários e do cidadão", defende Mariana Nina, membro do conselho nacional do partido.
Para a coordenadora do núcleo da Maia há quase três anos, os votos a favor ao projeto de lei do PS para a autodeterminação da identidade de género de crianças nas escolas foi "a gota de água. Nos encontros mensais de membros em que trocamos ideias, aproveitamos para discutir a situação política e há um desânimo muito grande em relação a certas atitudes, declarações e formas de estar", indica.
Entre os membros que se desvincularão, consta, ainda, outro coordenador local: João Pedro Silva lidera o núcleo de Famalicão há um ano e meio. "Afasto-me por várias falhas que tenho identificado. Defende-se, por exemplo, a meritocracia, mas muitas pessoas, promovidas pela comissão executiva, não têm dado grandes provas de mérito. Em alguns casos, estão a ser promovidas por outras razões, como laços pessoais ou amizades", aponta.
Ao aperceber-se que a opinião dos núcleo "não era tida nem achada", Carlos Coelho deixou o cargo de vice-coordenador de Valongo durante as legislativas, ficando como membro do base. E acredita: "O partido desviou-se da narrativa liberal para se centrar em questões como a despenalização de drogas e questões da moda que nos distraem do fundamental, que é definir um projeto para o país".
Parlamento
Eutanásia
A IL mostrou-se disponível para confirmar o decreto sobre a eutanásia, depois do presidente da República ter rejeitado a lei pela quarta vez. O deputado liberal João Cotrim Figueiredo pediu "respeito institucional" pela Assembleia da República". O decreto, que resultou das alterações do PS, IL, BE e PAN, estabelece que a morte medicamente assistida só poderá ocorrer através de eutanásia se o suicídio assistido for impossível por incapacidade física do doente.
Venda de canábis
A IL deu entrada, na passada quinta-feira, a um projeto de lei, no Parlamento, no qual propôs legalizar a canábis, sugerindo que possa ser vendida a maiores de 18 anos em lojas físicas e online, incluindo supermercados. A proposta, que pretende reduzir a criminalidade e o consumo de drogas pesadas, proíbe a venda perto de estabelecimentos de ensino.
Autodeterminação
Os votos a favor e de abstenção dos oito deputados da IL aos projetos de lei do PS e BE, respetivamente, sobre a autodeterminação da identidade de género das crianças no âmbito escolar foi a gota de água para os 14 militantes da Iniciativa Liberal, que vão desvincular-se. Na missiva a que o JN teve acesso, os liberais acusam o partido de contribuir para "mais sofrimento, angústia e incerteza nas crianças", considerando "inadmissível" que a proposta normalize e institucionalize "a introdução de temas sexuais a crianças de tenra idade".
