Subsídio de 6600 euros à igreja para recuperar da covid-19 serve, em parte, para sustentar os párocos. Especialista em Direitos das Autarquias admite ilegalidade.
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A atribuição de um subsídio de 6600 euros à Fábrica da Igreja de Oliveira do Hospital para "minorar os prejuízos causados pela covid-19" por parte da Câmara, está a causar polémica dentro e fora da Igreja. A Autarquia de Oliveira do Hospital, liderada pelo PS, aprovou o pagamento de um subsídio "a ser distribuído em partes proporcionais pelas paróquias do concelho para fazer face a despesas de funcionamento no contexto covid-19", sendo que parte da verba se destina a pagar os salários aos três padres.
A proposta foi aprovada com os votos favoráveis dos vereadores do PS e o voto contra da vereadora do PSD, mas a polémica está instalada com a publicação de comunicados na Imprensa local e circulação de emails anónimos afirmando que o dinheiro se destina a "pagar o salário a três sacerdotes".
"A verba é uma ajuda às paróquias e, entre outras despesas, para garantir o sustento dos padres", disse ao JN António Loureiro, padre responsável pela Fábrica de Igreja de Oliveira do Hospital. Com 20 paróquias, maioritariamente entregues aos párocos António Loureiro, Paulo Silvestre e Rodolfo Albuquerque, depende, religiosamente, da diocese de Coimbra.
"A Câmara apoiou porque os sacerdotes pediram e porque sabemos que por causa da pandemia as paróquias perderam rendimento", afirmou José Carlos Alexandrino, presidente da Câmara de Oliveira do Hospital e líder a Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra. "É uma ajuda financeira que também daremos a outras entidades religiosas que nos peçam auxílio", frisou o autarca, afirmando que a Câmara "também está a apoiar 198 famílias que ficaram sem rendimento".
"As paróquias são autónomas e a diocese de Coimbra também está em crise e não nos pode ajudar. A Câmara teve um gesto solidário que agradecemos porque nos vai ajudar a suportar as despesas", disse António Loureiro.
Covid não justifica tudo
"Aparentemente, a Autarquia está a violar o princípio de igualdade e está a atribuir um subsídio sem especificar a que se destina", explicou Joaquim Freitas Rocha, do Núcleo de Estudos de Direito das Autarquias Locais. "Uma autarquia não pode atribuir um subsídio (pago com dinheiros públicos) sem justificar em que vai ser gasto e a covid, por si só, não é justificação", frisou.
Na ata da reunião onde consta a aprovação do donativo, diz apenas que a verba se destina a "fazer face a despesas de funcionamento no contexto da covid-19".
"A Fábrica de Igreja saberá muito bem dividir o dinheiro e onde o deve gastar", diz José Carlos Alexandrino.
"Os padres têm um salário que ronda os 750 euros e, tal como toda a gente, estão a sentir a falta de dinheiro mas será que deve ser a Câmara a ajudar?", perguntou um habitante de Oliveira do Hospital, "católico e socialista", que pediu anonimato. "Gosto da gestão da Câmara mas não havia necessidade de, por tão pouco, dar a entender que ajuda os amigos", finalizou.
Habituado a subir ao altar
O presidente da Câmara de Oliveira do Hospital, José Carlos Alexandrino, é conhecido por participar ativamente em algumas eucaristias.
Em maio, na igreja de Ervedal da Beira, José Carlos Alexandrino terá sido convidado por um grupo de jovens a subiu ao altar para dizer que enquanto for presidente "ninguém ficará para trás". "Sabemos que o desemprego vai aumentar e que vamos sofrer e podem ficar algumas obras para trás, mas ninguém ficará para trás", disse o autarca.
Já em outras ocasiões, o político participou ativamente em cerimónias religiosas. Ao JN, afirmou que "enquanto presidente de Câmara não tem religião" e que, por isso, vai onde o convidarem