
Quando as redações eram analógicas, no planeamento da edição de 1 de abril havia sempre uma intensa discussão sobre que mentira iria ser publicada com destaque de primeira página. Tinha de ser minimamente credível, mas não a ponto de enganar ninguém sobre algo demasiado importante. Um equilíbrio difícil, portanto.
Até porque mentira, diz-nos o dicionário, é um engano, uma fantasia, uma ilusão, uma falsidade, uma patranha, uma peta, uma tanga. Preto no branco.
Isto tudo a propósito do Dia das Mentiras, uma tradição alegadamente herdada de França e da mudança do calendário juliano para o gregoriano em 1582, mas não há certezas. Na verdade, até pode não ser bem assim, o que não é muito relevante, principalmente quando a efeméride vem perdendo tração social. Talvez porque seja cada mais difícil distinguir a realidade da narrativa. Ou porque nos levamos todos demasiado a sério. Foi o que aconteceu com o cancelamento da Festa do Futebol Juvenil que deixou muita gente em pânico. O anúncio foi partilhado na página da Federação Portuguesa de Basquetebol que, horas mais tarde, desmontou a patranha, deixando furiosos alguns pais, que usaram as redes sociais para criticar o que consideraram ser uma brincadeira de mau gosto.
A história deste dia faz-se de algumas histórias, umas previsíveis, outras improváveis. Das que já não espantam: os problemas no SNS. Depois de um fim de semana prolongado e problemático nas urgências, hoje a situação voltou á normalidade possível na obstetrícia do Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, que já recebe grávidas transportadas de ambulância.
Mas noutras paragens os constrangimentos vão continuar. A Urgência Pediátrica da Unidade Local de Saúde Viseu Dão-Lafões vai continuar encerrada durante os períodos noturnos ao fim de semana, devido à falta de médicos pediatras, ao longo deste mês de abril.
Das histórias improváveis destaca-se o caso do polícia que acabou por abater, em alegada defesa pessoal, o assaltante que o raptou. O agente do corpo de segurança pessoal da PSP terá sido raptado na madrugada desta segunda-feira, na zona de Algés, por um casal, sob ameaça de arma, e obrigado a ir a um multibanco. Depois, o polícia terá conseguido atrair a dupla até sua casa, localizada num prédio em Benfica habitado por polícias. E foi aí que conseguiu aceder à sua arma de serviço e atingir mortalmente o assaltante, pedindo depois ajuda aos vizinhos polícias.
O 1 de abril é também o dia em que a Alemanha descriminaliza o consumo de canábis. É o terceiro país da União Europeia, depois de Malta e Luxemburgo, a autorizar o uso recreativo e o cultivo doméstico daquela substância psicoativa. AQUI pode ver o vídeo dos festejos em Berlim.
E no calendário fiscal o 1 de abril marca o início do prazo para entrega do IRS. Se quer saber se está abrangido pela declaração automática, como funciona o IRS jovem e quais os prazos para os reembolsos, tem AQUI um explicador que esclarece todas as dúvidas.
Voltando ao Dia das Mentiras, que em Portugal coincide com o último de António Costa como primeiro-ministro e com a véspera da investidura de Luís Montenegro, recordo uma frase atribuída a Napoleão Bonaparte de grande pragmatismo político: “A História é um conjunto de mentiras sobre as quais se chegou a um acordo”. Marcelo Rebelo de Sousa dá hoje posse ao novo Governo, o 14.º constitucional e o terceiro desde que é presidente da República. Um executivo fortemente político (mais de 60% do elenco ministerial pertence à Comissão Permanente do PSD) que, sem respaldo de uma maioria num Parlamento partido em três grandes blocos, vai precisar de negociar, à esquerda e à direita, e chegar a consensos para bem do país. Os 17 ministros - dos quais só uma já exerceu funções ministeriais (Maria da Graça Carvalho foi ministra da Ciência e Ensino Superior dos Governos PSD/CDS-PP de Durão Barroso e Santana Lopes será agora ministra do Ambiente e Energia) embora haja seis que já ocuparam secretarias de Estado (Paulo Rangel, António Leitão Amaro, Manuel Castro Almeida, Pedro Duarte, Fernando Alexandre e Miguel Pinto Luz) - tomam hoje posse e os respetivos secretários de Estado, que continuam no segredo dos deuses, na sexta-feira.
A fechar esta newsletter, uma história de sucesso escrita no feminino. Madonna é "a artista viva mais bem-sucedida da história", defende a investigadora Thati Aquino, radicada em Portugal e coautora do livro "Madonna: 40 anos de vanguarda". Numa cultura marcada pelo “descarte”, a cantora norte-americana mantém-se relevante há décadas, o que, gostos à parte, é verdadeiramente notável.
