Formou-se em Direito, mas foi na área dos transportes que fez praticamente toda a vida profissional. Próximo do PSD, quis demitir-se quando soube da tragédia. Acabou na ribalta pelos piores motivos.
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O cenário da conferência de imprensa de Pedro Bogas no pós-descarrilamento do Elevador da Glória, que a 3 de setembro causou 16 mortos, a maior tragédia em Lisboa em número de vítimas desde as cheias de 1967, dizia (quase) tudo. Com um fundo negro por detrás, o responsável máximo da Carris vestia blazer preto e usava gravata da mesma cor. Só a camisa era branca e sobressaía do ambiente pesado. Luto, luto e mais luto. E um homem sozinho perante um batalhão de jornalistas e escassas respostas concretas para dar. Deixou as justificações possíveis, defendeu-se a si e aos seus colaboradores, apontou caminhos urgentes, tentou argumentar com o pouco que ainda sabia em concreto. "Tratou-se de uma situação perfeitamente inimaginável e inusitada", reconheceu. "Posso garantir que a segurança é uma prioridade absoluta da Carris", garantiu. "Os técnicos conhecem muito bem a operação dos ascensores e estão perplexos", desabafou. "Seremos intransigentes no apuramento das causas", prometeu. "O plano de manutenção foi escrupulosamente cumprido", assegurou. Deixou a sala como entrou. Só.
Depois das primeiras palavras sobre o acidente que atirou o mítico ascensor lisboeta para a ribalta do Mundo pelos piores motivos, Pedro Bogas encontrou-se com o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, e colocou o lugar à disposição - a Carris é tutelada pelo município desde 2017. O pedido foi imediatamente recusado pelo autarca, que lhe devolveu a confiança e insistiu que não deveria deixar o lugar. Usou um argumento fortíssimo. "Aqui ninguém foge", respondeu Moedas a Bogas quando lhe solicitou a saída num gesto de responsabilização institucional pelas consequências do desastre daquele fim de tarde fatídico, avançou a CNN. E ele ficou. Ficou e foi apenas ele próprio para o encontro com os media.
Quando soube do terrível acontecimento, os dias pareceram-lhe horas. Dirigiu-se imediatamente à Calçada da Glória, onde tudo aconteceu, tentou justificar o injustificável pela primeira vez à comunicação social. Foi o primeiro desafio público de monta de Pedro Bogas, habituado a um percurso marcado pela discrição e a sobriedade. "É alguém que prefere trabalhar na sombra e deixar os outros brilharem", avança à NM um amigo próximo, que prefere não se identificar. "Nunca gostou muito da ribalta, pelo contrário", acrescenta.
Licenciado em Direito pela Universidade Católica de Lisboa, Pedro Bogas sempre se mostrou próximo do PSD, embora nunca tenha aderido ao partido. Começou por trabalhar na sociedade de advogados Ferreira Pinto & Associados durante dez anos, de onde saltou, em 2006, para vogal do Conselho de Administração do Metropolitano de Lisboa, que acumulou com lugares em outras duas empresas ligadas à exploração de espaços comerciais e de publicidade relacionadas com aquele meio de transporte. A experiência durou três anos e foi interrompida por um convite para liderar os Recursos Humanos e a Direção-Geral de Organização e Desenvolvimento da REFER, em 2009.
Com a chegada de Pedro Passos Coelho ao Governo, em 2011, numa altura em que Portugal enfrentava um duro programa de intervenção externa debaixo da tutela da troika - Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional -, foi chamado a adjunto do gabinete do secretário de Estado das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, Sérgio Monteiro, com o qual planeou uma vasta operação de privatização dos transportes públicos a nível nacional. Desempenhou funções durante pouco mais de um ano, até ser chamado novamente a um cargo que conhecia bem, o de vogal do Conselho de Administração do Metropolitano de Lisboa.
Passou depois pela Infraestruturas de Portugal e pela Empresa de Tráfegos do Funchal antes de assumir a liderança da Carris, que ajudara a subconcessionar quando colaborara com o Governo, em 2022, já com Carlos Moedas presidente da Câmara de Lisboa.
"A Carris vai ser uma empresa pública, mas vai ser uma empresa gerida pelo município de Lisboa", resumiu então desta forma os seus propósitos. O mandato estava a ser tranquilo. Até àquele tristemente célebre fim de tarde em que o centenário ascensor da Glória - 170 anos de ininterrupta e tranquila atividade até então - saiu da marcha normal, desceu desenfreado a grande velocidade até chocar com a fachada de um imóvel e transformar-se num depósito de mortos e feridos.
Foi o primeiro do resto dos dias de Pedro Bogas.
Cargo
Presidente da Carris
Nascimento
23/11/1973 (51 anos)
Nacionalidade
Portuguesa (Lisboa)
[Perfil é uma rubrica semanal da Notícias Magazine]