Quem acompanha regularmente as causas da Justiça, no exercício do seu direito de cidadania, talvez cultive alguma curiosidade sobre certas questões essenciais nas quais assentam as decisões judiciárias: Como acontece o ingresso nas magistraturas, que espécies de magistratura existem em Portugal, quais as funções de cada uma delas, porque se fala tanto da morosidade da Justiça, entre outras.
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É um direito do cidadão estar informado para que com conhecimento de causa possa discutir e criticar as várias decisões que são levadas às notícias públicas, bem como interiorizar as normas processuais imperativas que comandam o destino de um processo criminal. Tudo começa no Centro de Estudos Judiciários (CEJ). Após duras, complexas e extensas provas escritas e orais, os candidatos que obtêm nota positiva suficientemente boa para preencher uma das vagas postas a concurso frequentam aquele centro de formação recebendo aulas teórico-práticas e beneficiam de estágio em diversos tribunais. Optam por uma das duas magistraturas, MP ou Juiz, embora toda a formação e estágio sejam comuns. Durante este período longo de preparação para a função, os candidatos são sujeitos a avaliação contínua e avaliação final. Confirmado o aproveitamento dos formandos, são nomeados magistrados do MP ou juízes e empossados em cerimónia solene perante o/a procurador(a) geral da República ou perante o (a) presidente do STJ, respectivamente. Imporia o bom senso e a boa gestão dos quadros que estes novos magistrados fossem colocados em tribunais de menor movimento processual e de competência genérica, ou seja tribunais que decidem das várias áreas do direito, processo crime, civil, trabalho, família e menores, entre outros, para que lhes fosse mais acessível a aquisição da experiência e o traquejo necessário ao exercício diligente, eficiente e eficaz das múltiplas e complexas funções que lhes estão afectas. A realidade, porém, é outra, a falta sistémica de magistrados impõe a colocação destes recém-magistrados em comarcas de grande dimensão e movimento processual, com a atribuição de processos complexos, que exigem profundos conhecimentos do direito e da jurisprudência. Estes dominam a teoria que lhes foi ministrado no CEJ, mas falta-lhes a experiência e a prática necessárias para enfrentarem o complicado dia-a-dia que se vive nos tribunais. É à custa de muito sacrifício, pessoal e familiar, com muita tensão e dúvidas que estes magistrados, já sem o apoio e cobertura dos formadores, têm de decidir, a cada momento, o rumo a seguir num processo, num atendimento ao público, num debate instrutório ou numa sessão de julgamento, tal como um trapezista sem rede.
A fundamental distinção entre a magistratura do MP e a magistratura judicial é, como vulgarmente se diz na gíria judiciária, que o MP é uma magistratura de pé e a judicatura (juízes) é uma magistratura sentada, significado que será explicado no próximo artigo.
(continua)
A autora escreve segundo a antiga ortografia
Ex-diretora do DCIAP