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Foi a 2 de junho de 1888 que surgiu, pela primeira vez, nas bancadas, o "Jornal de Notícias". Quatro páginas, em grande formato, por um preço de 10 réis. Estávamos já na fase noticiosa ou industrial do jornalismo, inaugurada a 1 de janeiro de 1865 pelo "Diário de Notícias" que pretendia ser um jornal independente, financiado com receitas própria. Passados 130 anos, o JN é um dos títulos mais bem consolidados junto do público. Com expressividade nacional, tem conseguido fazer vingar os seus traços distintivos: a proximidade aos leitores e a atenção à realidade das diferentes regiões. Num tempo de abundância informativa, fazem-nos falta projetos que olhem para o que somos e para aquilo que construímos nos territórios que habitámos.
"Eliminando o artigo de fundo, não discute política, nem sustenta polémica. Regista com a possível verdade todos os acontecimentos, deixando ao leitor o comentá-los ao seu sabor". Era assim que Eduardo Coelho apresentava a linha editorial do DN, na sua primeira edição. Esse texto, talvez hoje demasiado banal, constituía um enorme desafio para uma época em que os títulos apareciam à mesma velocidade a que sucumbiam, sempre pendurados em partidos e funcionando como agitadores de propaganda. Vivíamos a fase romântica ou de opinião que Eça de Queirós tão bem retrata no episódio do jornal "A Tarde", dirigido pelo deputado Neves, na obra "Os Maias". No início de 1965, o DN vinha propor um jornal noticioso, financiado pela publicidade e venda de jornais. Era muito ousado. Progressivamente foram surgindo alguns seguidores. Uns mais independentes, outros ainda apoiados em partidos. Muitos ficaram pelo caminho. O "Jornal de Notícias" vingou, ainda que, neste caso, o risco fosse maior, porque era feito a partir do Norte, num período em que as comunicações eram muito rudimentares, a publicidade não reunia investidores seguros e os leitores não constituíam uma comunidade alargada. E ainda havia um preço de capa a replicar da concorrência: dez réis. Na "História da Imprensa Periódica Portuguesa", José Tengarrinha escreve que, nessa altura, "o custo dos jornais era de 40 réis em média por exemplar". Neste contexto, não seria fácil impor um projeto jornalístico. À época, terá sido fundamental algum apoio dos regeneradores, um partido que o jornal assumiu defender no primeiro número. No entanto, o JN nunca desvalorizou a vertente noticiosa e isso terá sido decisivo no seu sucesso. Apesar de algumas vicissitudes, vingou e desempenhou ao longo de todos os anos um papel fundamental do campo jornalismo. Passados 130 anos, o JN continua a fazer falta.
O "Jornal de Notícias" terá hoje uma das maiores redes noticiosas do país, que resulta dos correspondentes em várias cidades, dos jornalistas destacados nas redações do Porto e de Lisboa para olhar com atenção para as regiões e das múltiplas e descentralizadas fontes de informação cuja relação o jornal foi cultivando ao longo dos anos. Esse trabalho é visível nas edições em papel, no site, nas contas das redes sociais... E isso é de uma enorme riqueza para a dinâmica do espaço público por onde todos circulamos.
Por estes dias, o campo político introduziu na agenda nacional o interior do país como uma prioridade absoluta. Ora, ninguém poderá valorizar o chamado país real, se não for capaz de o inscrever no campo mediático. E isso constitui atualmente um problema colossal. Porque os média desinteressaram-se das realidades locais. Vivem agarrados às elites do poder que se fossilizaram na capital. Ora, não foi esse o caminho que seguiu o JN. Felizmente.
Em tempo de aniversário, há que dar os parabéns ao "Jornal de Noticias". Fazer vingar um jornal durante 130 anos é obra! Isso deve-se à gestão dos sucessivos proprietários, à visão dos vários diretores que tomaram em mãos este projeto e, claro, a todos os jornalistas que o vão construindo todos os dias. Em permanência. Hoje, tal como ontem, continua a abrir-se caminho. Espera-se que passe sempre bem perto das pessoas. Das que moram nos centros e das que habitam periferias que são cada vez mais lugares nómados. Se tal continuar a acontecer, os leitores continuarão fiéis a este projeto editorial.
PROF. ASSOCIADA COM AGREGAÇÃO DA UMINHO