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De entre as várias tendências anunciadas por Marian Salzman (e aqui sucintamente descritas na semana passada) chamo a atenção para a que se referia ao comércio a retalho.
Segundo um relatório da Bloomberg de novembro de 2017, espera-se que, nos EUA, 6800 lojas de grandes cadeias de retalho fechem as portas em 2018.
As lojas em causa situam-se essencialmente em shoppings. Isto quando o consumo e a confiança dos consumidores estão em alta e o desemprego está em mínimos históricos.
Segundo a Bloomberg, a razão desta "debacle" não tem origem no império Amazon ou no desinteresse reportado de cerca de 20% dos consumidores que dizem preferir gastar dinheiro em viagens ou experiência menos materiais.
A razão deste apocalipse tem sobretudo a ver com a situação financeira das principais cadeias de retalho, espartilhadas por dívida excessiva de elevado rendimento e com início de amortização prevista, em grosso, a partir de 2019.
O ciclo de refinanciamento que tem vindo a adiar o desfecho está a terminar pela dupla perspetiva negativa sobre o interesse na tomada de dívida com elevado risco (ainda que de high yield) e sobre o futuro do comércio de retalho assente em lojas físicas.
As recentes experiências da loja sem caixas da Amazon ou da Loja do Futuro da portuguesa Farfetch sublinham o início de um caminho sem retorno para o comércio de retalho que hoje maioritariamente conhecemos.
O problema está no impacto que este fenómeno poderá vir a ter na economia e nas finanças dos EUA e, por contágio, em muitos outros nesta rede global onde nos ancoramos.
O impacto financeiro é enorme: as falências cada vez mais frequentes de grandes cadeias de retalho (como a Toysrus) colocam sob stresse um conjunto significado de stakeholders financeiros que vão dos investidores, aos bancos com quem trabalham até às sociedades financeiras emissoras dos inúmeros cartões de crédito associados às várias cadeias e que veem o seu malparado aumentar porque os clientes se recusam a pagar as dívidas que fizeram em lojas que, entretanto, deixaram de existir.
Mas o maior problema será mesmo de natureza económica. Só nos EUA estima-se que existam oito milhões de pessoas empregadas como vendedores ou caixas em lojas de retalho. O impacto de um desemprego potencial desta ordem de grandeza é difícil de imaginar.
Nesta nossa cidade de comerciantes seria talvez interessante organizar uma reflexão séria sobre o tema.
ANALISTA FINANCEIRA