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O editor de Opinião deste jornal informou-me, na manhã de ontem, que a nova estrutura gráfica obrigava a que estas crónicas, imperativamente, não ultrapassassem os 2500 carateres (com espaços, como se diz na linguagem dos textos). Ele sabia bem por que me avisava: é que este escriba excedia regularmente esse limite teórico e avançava, à desfilada, por um número de consoantes e vogais que levavam a Gonçalo Cristóvão, ao final da tarde das quintas-feiras, a ter de lutar contra a lei física da impenetrabilidade.
Todo o cronista começa por ser leitor. E creio que todo o leitor sonha em ter à sua frente textos curtos, onde o essencial seja dito em poucas palavras. Na minha juventude, lia no "Le Monde", numa pequena caixa na "la une" do jornal, as minicrónicas de Robert Escarpit. Era um professor de Bordéus que conseguia, em 700 carateres, dizer o que era importante, sobre tudo e mais alguma coisa. Eu que, nessa altura, não sonhava em escrever no "Notícias" (como o JN era então conhecido no Norte), fiquei sempre a sentir uma admiração profunda por quem era capaz de produzir essas crónicas sintéticas e, nem por isso, menos substantivas.
Quando vivi no Brasil, passei a ser apreciador diário dos magníficos textos curtos da sua grande imprensa. Na escola quase imbatível de um Nelson Rodrigues, escritores como Ruy Castro ou Carlos Heitor Cony enchiam-me as medidas, sem excederem as do jornal, com crónicas deliciosas, num Português "de lei", temperado pela riqueza vocabular desses então alegres trópicos. Um dia, cruzei-me com Cony na Academia de Letras e perguntei-lhe qual era o segredo que usava para iniciar os seus textos: ""Baixadô! Pense na frase com que pretende se despedir do leitor e logo verá que vai ter pressa em começar a escrever". Levei a lição para casa, tento regularmente aplicá-la e quase sempre falho. A genialidade ainda não tem manual.
Aqui chegado, vejo que tenho pouco mais de 600 carateres para usar neste texto. Equivalem a dois "tweets" e eu, embora com muito menos leitores do que Trump, tenho a pretensão de escrever para quem aprecia algo mais do que a sua incontinência teclada. Que posso dizer? Como já é tarde para falar do encontro em Singapura e, tristemente, cedo ainda para me congratular com a saída de Bruno de Carvalho do meu Sporting, fico-me por aqui, antes que o editor de Opinião do JN se veja obrigado a usar o "delete". Terei, mesmo assim, sido longo demais? Talvez. Mas posso confessar um segredo? Não tive tempo para ser mais breve.
EMBAIXADOR