Os números são conhecidos: cerca de 1,6 milhões de portugueses (aproximadamente 10% da população, portanto) vivem abaixo do limiar da pobreza, que é o mesmo que dizer que dois em cada cinco agregados familiares enfrentam o mês com cerca de 833 euros.
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Ainda que estes valores - os mais recentes - correspondam ao menos gravoso dos cenários verificado desde o ano 2000, a verdade é que a pobreza se instalou entre nós como um cancro terminal, que passa de geração em geração e para a qual parece não haver cura.
Ao olharmos para o programa de ajuda financeira às famílias aprovado pelo Governo alemão, em comparação com as medidas de mitigação de danos da crise energética aprovadas pelo Governo português, ficamos desconsolados, para dizer o mínimo, mas os 60 euros de ajuda que Portugal aprovou para fazer face às despesas das famílias que já são beneficiárias da tarifa social de energia são simultaneamente o retrato da nossa tibieza orçamental e da enorme diferença que tão pouco é capaz de fazer na vida de tantos. Um em cada dez portugueses que tem um emprego é pobre, convém não esquecer.
Estima o Governo que esta ajuda de 60 euros chegue a 762 320 famílias, o que equivale a dizer que pode ter cerca de 1,4 milhões de cidadãos como potenciais beneficiários diretos. É a face visível do que somos há demasiado tempo: um país empobrecido e envelhecido, que vai ficando amarrado à cauda europeia do progresso. A emergência alimentar e energética fez emergir novamente essa condição estacionária. Não devia, por isso, haver outro tema na agenda política que não o da urgência do desenvolvimento e sustentabilidade económica de Portugal. As nossas fragilidades estruturais tendem a agravar-se sempre que há uma crise como esta que agora nos aflige. E este imenso Portugal que não tem voz fica sempre, mas sempre, para trás.
*Diretor-adjunto