Com um discurso improvisado, o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, inaugurou esta semana, no Parlamento Europeu, a presidência rotativa da União Europeia no segundo semestre do ano corrente, com renovada energia e ímpeto reformador. Apesar de vagarosa e claudicante, a Europa vai persistir no caminho das reformas imposto pela necessidade de combater a crise da moeda única e inverter o atual ciclo de estagnação económica, flexibilizando a rigidez orçamental que marcou as políticas desastrosas que afetaram com especial dramatismo os países do Sul, comprometendo o pacto de solidariedade inscrito na sua fundação. No Parlamento Europeu, Matteo Renzi destacou a importância do regresso à "Europa dos valores" e da "dimensão humana" que é preciso incorporar na sua atuação como pressuposto legitimador das suas políticas e condição de salvaguarda da sua reputação externa, lançando o desafio de "começar a desenhar o futuro já, porque o Mundo corre a uma velocidade maior do que a Europa".
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Referindo-se em concreto à necessidade urgente da adoção de políticas de desenvolvimento económico, o primeiro-ministro italiano recordou que "todos assinámos um Pacto de Estabilidade e Crescimento, e este é um elemento fundamental da política europeia. Sem crescimento, a Europa não tem futuro". E para refutar uma intervenção do novo líder do grupo parlamentar do Partido Popular Europeu, Manfred Weber, que se tinha insurgido contra o desígnio explícito de flexibilização da política orçamental europeia, Matteo Renzi entendeu útil chamar-lhe a atenção para um passado ainda recente: "Se Weber fala em nome da Alemanha, recordo-lhe que nesta mesma sala, sob a anterior presidência italiana (a Alemanha) foi o único país ao qual foi concedida flexibilidade e que violou os limites para ser hoje um país que cresce (...) Assinámos em conjunto um pacto de estabilidade e crescimento. Não só de estabilidade!". Ao mesmo tempo que se bate na Europa contra as políticas exclusivamente centradas no equilíbrio das contas dos estados e prepara condições favoráveis para a revisão do pacto orçamental que as suporta, o Governo italiano não descurou a resolução dos seus problemas internos.
Logo após a sua vitória eleitoral, o Partido Democrático de Matteo Renzi tomou a iniciativa de um conjunto de projetos de reforma institucional com vista a assegurar a governabilidade do país e o controlo das despesas públicas, e que envolvem, designadamente, a reforma do Senado e do sistema eleitoral, o estatuto das autoridades independentes ou a sustentabilidade da Segurança Social. São estes temas que hoje apaixonam a vida política italiana e alimentam um vivo debate público que põe à prova a abertura ao diálogo e a capacidade negocial dos novos governantes com as forças da oposição parlamentar e com os movimentos da sociedade civil.
Indiferente aos debates que se travam na Europa e fiel seguidor da ortodoxia orçamental germânica, o Governo de Portugal - membro da família política do Partido Popular Europeu - não encetou as reformas institucionais requeridas para assegurar a sustentabilidade da contenção da despesa pública nem quis verdadeiramente quaisquer negociações com a Oposição. Pelo contrário, iludindo as expectativas que tinha criado nos eleitores - e que lhe valeram a vitória eleitoral com a promessa de atenuar os excessos de austeridade do Governo que o antecedeu - o novo Governo proclamou o desígnio de ir além do "memorando de entendimento", em vez de iniciar imediatamente a renegociação da dívida e do programa de resgate, logo desde o primeiro dia do mandato. O que, aliás, podia ter feito com indiscutível legitimidade uma vez que o teor do "memorando" fora negociado pelo seu antecessor... cuja demissão, justamente, precipitara! Alegou porém que não havia alternativa, que era este o único caminho, e desencadeou uma onda de destruição económica que em apenas três anos mergulhou o país no mais cruel desespero ao mesmo tempo que se revelava incapaz de travar o crescimento galopante da dívida que supostamente pretendia combater.