A arte de discordar na era da inteligência artificial
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A inteligência artificial tem vindo a expandir exponencialmente o volume de dados a que todos nós temos acesso diariamente, tanto individualmente como coletivamente. A sua extraordinária capacidade de processamento aproxima-nos de um mundo onde o acesso e a combinação de informação se tornam praticamente ilimitados. Resta-nos, porém, um ativo mais escasso: a capacidade humana de construir interpretações ricas em sentido e significado a partir de toda esta informação.
A capacidade generativa da máquina dependerá sempre do que lhe for introduzido e dos mecanismos de consenso que articula entre informações dispersas. A divergência entre versões é neutralizada, e o desacordo, tão importante como fonte de interpretação e criação de novo conhecimento para o humano, é assumido apenas como um resultado baseado em padrões. Mas se a máquina ainda não é capaz de raciocínios de subjetividade, é aqui que poderemos tirar partido de toda a informação disponibilizada para a interpretar, criar opiniões e, mais importante, poder confrontá-la e debatê-la com outras perspetivas humanas.
Num mundo interdependente, onde o poder de decisão é cada vez mais disperso e partilhado, pensar de forma divergente, mas coletiva, é uma das melhores formas de atingir acordos melhorados. Onde antes os decisores procuravam consensos absolutos, em muito suportados por dados e conhecimento concentrados, hoje, com a democratização da informação através da tecnologia, o foco do desafio tende para a qualidade de interpretação e de argumentação da discordância sob a qual as decisões se constroem. Transformar estas divergências, mais fundamentadas, num diálogo pluralista e construtivo, pode ser uma excelente ferramenta de inclusão e de qualidade de decisão para melhores políticas, estratégias e resultados.
A qualidade da discordância tornou-se um bem público. Num tempo de abundância de dados, mas de escassez de reflexão, o verdadeiro diferencial não está na acumulação da informação, mas em como a pensamos melhor em conjunto, mesmo que de forma distinta. Nos nossos diálogos diários (virtuais ou presenciais), nas nossas empresas, e até na nossa democracia em geral, precisamos de uma gestão eficaz do bem que é a discordância, levando a que a diversidade de perspetivas não seja um obstáculo, mas uma fonte de inteligência coletiva, ajudada pelo processamento artificial da informação, e interpretada pela arte humana de a compreender e debater.

