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Quando se elege para presidente da República o maior comentador político do país, era de esperar que coisas como estas começassem a acontecer... Estavam as eleições autárquicas sossegadinhas à espera de iniciarem o seu ciclo normal de inaugurações e de guerras fratricidas no interior dos partidos para nomeação dos candidatos, quando Marcelo soltou a sua bomba: "Desiludam-se aqueles que pensam que o presidente da República vai dar um passo sequer para provocar instabilidade neste ciclo que vai até às autárquicas. Depois das autárquicas, veremos o que é que se passa".
Marcelo Rebelo de Sousa ainda encenou um ligeiro recuo, mas o alerta estava dado e soaram as campainhas do comentário político. "O presidente marcou o prazo de validade do Governo para as autárquicas", disseram uns. "O presidente está a colocar a prazo a liderança de Passos Coelho", perscrutaram outros. O que quer que resida no esfíngico aviso, o mote está dado para que as próximas eleições autárquicas sejam olhadas como teste à política nacional, num exercício de extrapolação que é sempre possível, mas que, assim à distância, parece desvalorizar aquilo que, afinal, deve ser avaliado pelos eleitores: a boa ou má gestão do seu município. É como se os milhares de eleições que se vão realizar um pouco por todo o país fossem só uma etapa para olharmos os resultados nacionais e vermos uma qualquer tendência que, se calhar, nem está inscrita naquilo que leva os eleitores a votar como irão votar.
Mas os municípios merecem mais consideração. Pelo papel fundamental que as autarquias têm tido na gestão de uma parte cada vez mais significativa da vida dos cidadãos, por terem estado na primeira linha de socorro à crise, por terem sabido poupar em tempos de escassez, por terem efetuado um trabalho notável de renovação com a lei de limitação de mandatos... tudo coisas que pudemos ler ontem no suplemento que o JN dedicou aos 40 anos de Poder Local.
E, ontem também, ouvimos o presidente, na Conferência dos 128 anos do JN, alertar para algo que pode também baralhar ainda mais as eleições autárquicas. Marcelo Rebelo de Sousa veio afirmar-se atento quanto aos projetos descentralizadores do Governo, nomeadamente os que envolvem as CCDR e as áreas metropolitanas. O presidente quer perceber, como todos queremos, e de preferência com tempo suficiente de antecedência para que, por uma vez, o modelo seja consensual e claro. Os autarcas merecem essa atenção e os eleitores também.