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De todas as vezes que, indecorosa e inadmissivelmente, se expõe à publicidade investigação criminal, em segredo de justiça, relativa a cidadãos relevantes na sociedade, de imediato surgem opiniões incisivas e irresponsáveis a defender o constrangimento ou mesmo a eliminação da autonomia do MP. Imputam-lhe a responsabilidade da divulgação do caso, sem que disso tenham a mínima prova, afirmando, ainda, que o MP cavalga à rédea solta sem qualquer controlo ou responsabilização na busca abusiva de elementos de prova. É importante sublinhar que os defensores desta tese advogam a subordinação desta magistratura ao poder político! Não é por acaso ou por ingenuidade. Um MP amordaçado às ordens do poder político não permite a realização de uma investigação livre e objectiva sujeita apenas aos critérios da legalidade e da constitucionalidade. A tutela passaria a determinar quais as investigações a prosseguir, as que visassem por exemplo os adversários políticos, e aquelas que por razões de oportunismo, clientelismo, corrupção ou tráfico de influência deveriam ser travadas e, porventura, arquivadas. Pensará alguém que no tempo do Estado Novo não havia crime económico-financeiro? E, no entanto, os casos registados só se referem à corruptela de um qualquer funcionário público anónimo, sem qualquer notoriedade na escala social e política. A realidade judiciária dos países que optaram pela dependência do MP do poder executivo é a quase inexistência de investigações embaraçosas e o controlo apertado, directo e concreto através de ordens e directivas por parte da tutela política. O nosso país está no caminho da verdade material e da Justiça igual para todos os cidadãos com a consagração de uma autonomia do MP face aos restantes órgãos de soberania. Os casos submetidos a julgamento correspondem a inquéritos nos quais foi possível recolher indícios suficientes para suportar uma condenação, se se mantiverem na fase de julgamento os elementos probatórios elencados na acusação deduzida. Recentemente, retomou-se essa discussão, mas as vozes destes detractores da autonomia são cada vez mais débeis e renegados pela maioria dos cidadãos, atentos e preocupados com os assuntos da Justiça. Haverá, sim, que nos interrogarmos, inquietarmo-nos e discutirmos o que vai mal no MP, na aparente desagregação da hierarquia e no seu funcionamento atomístico. Neste campo, sim, há falhas que importa ultrapassar, recuperar todas as funções, forma de as cumprir e modo humanizado de levar a cabo todos os encargos que a lei impõe ao MP. Importa devolver aos magistrados do MP o orgulho, a dedicação e entrega que faz deles os defensores da legalidade democrática, os representantes e tutores dos trabalhadores, das crianças, dos incertos e dos incapazes, representando-lhes a responsabilidade de serem um órgão autónomo de Justiça responsável, hierarquizado, eficaz e eficiente.
*A autora escreve segundo a antiga ortografia