<p>Avaliei os prós e os contras, os riscos e as oportunidades, metendo-me na pele dos estrategas políticos do PS e do PSD. Procurei descortinar para lá dos vidros translúcidos, não fosse escapar-me algum pormenor capaz de mudar a percepção que tinha das coisas. Por mais contas que fizesse, o resultado era sempre o mesmo: socialistas e sociais-democratas andam a pelejar pelo poder - não é o exercício do poder o fim últimos dos partidos? - mas têm pela oposição um irreprimível apetite. Dois pequenos exercícios ajudam a perceber onde raio quero eu chegar com esta rebuscada análise da estratégia de ambos.</p>
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Comecemos pelo "dossiê" provedor de Justiça, a mais animada das novelas políticas dos últimos tempos, que promete mais umas quantas temporadas. Na mercearia da distribuição de lugares entre os dois maiores partidos, coube sempre ao PSD a indigitação para o cargo. Agora, porém, volta a reivindicar esse direito, com o lapidar argumento de que deve ser entregue à oposição.
Mesmo descontando a sempre atrevida pretensão de representar os outros partidos situados fora da órbita do poder - duvida-se que queiram ser representados pelo PSD - a conclusão é óbvia: Manuela Ferreira Leite e a sua equipa acalentam a secreta esperança de se manterem na oposição por muitos e bons anos. Com um vigilante provedor de Justiça, é certo, mas na oposição.
Ele há, porém, oposições e oposições. O PS, que por cá governa com maioria absoluta, integra a oposição no Parlamento Europeu. Pelos vistos, deseja conservar o estatuto, já que se apressou a dar a bênção oficial a Durão Barroso, actual presidente da Comissão Europeia e candidato a novo mandato pelo grupo político adversário, o conservador.
Bem se sabe que a maior das qualidades de José Manuel Barroso (é esse o seu nome, em "bruxelês") figura no bilhete de identidade. É português e isso basta aos socialistas para aplaudirem o homem que internamente combateram, quando era primeiro-ministro. É "nosso" e está nos centros de decisão - deve ter sido esse o raciocínio. Sucede que o PS poderia ter feito a declaração de amor mais tarde; talvez depois das eleições. Mas não: tratou de depositar quanto antes as credenciais.
Ao "amarrar-se" a Barroso tão precocemente - enquanto o PSE se mantém caladinho, a ver como param as modas -, José Sócrates mostrou já ter atirado a toalha ao chão ou, pelo menos, ter pouca crença na vitória nas europeias. Pior: esqueceu-se de tomar a elementar providência de avisar Vital Moreira. O professor de Coimbra, senhor da rara mania de dizer o que pensa, logo tinha de dar com a língua nos dentes, em defesa de um candidato próprio. E logo tinham de pegar no assunto os refilões do costume...