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A propósito destas eleições presidenciais um amigo provocava-me: "Vais votar PPN ou PPP"? A forma como decorreu esta campanha presta-se a esta fórmula caricatural de exprimir intenções de voto para o mais alto cargo na República Portuguesa. Não seria de esperar muito desta campanha. Pelos candidatos em presença, pela reserva tacticista das forças partidárias que os apoiavam (ou não), pelo estilo já provado noutras que não contém em si modos de trazer esclarecimentos. Porém, o que exigia uma campanha diferente era exactamente a actual situação do país, em aguda crise, que lança a maior parte dos portugueses num estado de desânimo, talvez o maior obstáculo numa luta a cooptar esforços para superá-la.
E para esta exigência, nem o candidato que vai ganhar, Cavaco Silva, concorreu de forma positiva. Cavaco Silva "jogou", nesta campanha, como já vinha fazendo nos últimos meses do seu anterior mandato. "Jogou" para ganhar. É legítimo, mas como provavelmente os próprios resultados irão confirmar, não é suficiente, nem prometedor, para garantir o "empolgamento" que um futuro presidente terá de ter, não para, porventura, demitir um governo, outrossim, tocar a rebate na consciência dos portugueses, particularmente, dos agentes políticos, da ordem financeira, económica e judicial estabelecida, que temos de mudar a face deste país, a idiossincrasia de grande parte da sua população. Esperar "salvadores da pátria" messiânicos encobre sempre perigos para a democracia. Mas esperar lideranças que consigam fazer emergir "vontade nacional" para ultrapassar desconfianças mútuas, conivências comprometedoras, digladiações partidárias, apontar "rumo certo", sem complacências, é condição imprescindível para não adiar mais o reencontro deste país. Cavaco Silva, tal como outros candidatos, cedeu a demagogias, a hipocrisias, a vagos compromissos com uma democracia que não é presidencialista.
A Oposição "ajudou". Alegre não conseguiu transmitir a alegria da esperança ao povo. Nobre não fez discernir que fazer política não é fazer louváveis campanhas humanitárias. Lopes cumpriu brilhantemente com o papel de reunir os "seus", mas não os outros. Defensor afrontou as "verdades e mentiras" do sistema. Por isso, acabou cada dia mais isolado pelos poderes. Coelho, sem meios, pode ter sido o lado "burlesco" da campanha, mas com os seus bem apanhados "sketches" ridicularizou o "establishment".
Enfim, esta foi uma campanha do tempo perdido. E o dia 24 não será a reinvenção da esperança dos cravos, mas a dos espinhos de rosas desfeitas.