Os grandes automóveis são um dos ícones que, normalmente, associamos aos americanos. Se assim pensava, reconsidere. Dois anos passados, num regresso às terras do Tio Sam, a alteração do parque automóvel é para mim a mudança mais evidente.
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As grandes "banheiras" quase desapareceram, com a utilização confinada aos táxis, idosos e pobres. Mesmo nos parques automóveis das residências de estudantes, onde abundavam, dado o baixo preço, predominam agora o que, nos Estados Unidos, chamam "compactos". A razão? A subida do preço da gasolina que atingiu o preço, ainda há poucos anos totalmente inimaginável, de mais de um dólar por litro. Para um economista, este é um excelente exemplo de como o preço condiciona as decisões. Se o preço da gasolina subiu, há que mudar para automóveis mais eficientes, com menor consumos. Mesmo que tal implique o sacrifício de algo que parecia fazer parte da maneira de ser americana. Consequências? A quota de mercado dos três grandes fabricantes de automóveis (General Motors, Ford e Chrysler) baixou, pela primeira vez, dos 50%, com as marcas europeias e, sobretudo, japonesas a ganharem uma posição cada vez mais forte. Veículos da moda, mas autênticos sorvedouros de combustível, como os chamados SUV, caíram em desgraça. Os stocks acumulam-se e as empresas anunciam o encerramento de algumas fábricas e a reconversão de outras para o fabrico dos modelos que essas mesmas empresas vendem na Europa. "Os europeus sabem fazer carros pequenos e eficientes", afirmava um dos responsáveis da Ford, "por isso vamos importar o conceito para cá e passar a fabricar esses modelos nos Estados Unidos". O equivalente ao Honda Jazz, chamado de Fit, torna-se num sucesso, algo que não passaria pela cabeça de ninguém há poucos anos. No mercado de usados, é possível comprar carros de luxo, mas com elevados consumos, a preços baixíssimos. Os anúncios de novos modelos centram-se na eficiência, no número de milhas por galão, indicador preferido pelos anglo-saxónicos. Quando se converte para os "nossos" litros aos cem, os valores podem não impressionar. Os melhores fazem 8 ou 9 litros. Mas aí há detalhes a ter em conta: são carros a gasolina (o gasóleo é caríssimo), com uma cilindrada elevada, habitualmente acima dos 2000 cm3, "compactos" na designação americana mas relativamente grandes na perspectiva europeia ou nipónica. Ou seja, há ainda mais algum caminho a fazer. Caminho que vai sendo percorrido como o comprova a capa do último número da "Wired", uma revista de referência no domínio da inovação, concedida à revolução do carro eléctrico, o mesmo que foi anunciado em Portugal como se fosse nosso quando ser parte do projecto é já, só por si, importante. Habituei--me a apreciar o pragmatismo dos americanos, a sua capacidade de decidir. E uma linguagem que os americanos entendem é a do dinheiro. Mexam-lhes na carteira e vão vê-los agir, ajustar-se. Certamente a contragosto, mas mais depressa que os europeus. Mesmo assim, o lóbi do petróleo continua a acenar com a miragem dos preços baixos se for possível fazer mais prospecções no mar. Tratando-se do povo mais rico do Mundo, espanta ver como a demagogia encontra terreno fértil na resistência à mudança. Afinal, lá como cá...