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A Casa Beires é uma das primeiras casas desenhadas por Álvaro Siza. Foi construída na Póvoa de Varzim há 40 anos e resiste ao tempo, habitada e admirável.
O "monumento à impossibilidade da razão" como o descreveu Alves Costa é ainda o costumado poema à luz e à natureza que Siza escreve e reescreve sempre que projeta.
Luís Ferreira Alves fotografou-a, a pedido de Álvaro Siza, e o resultado está agora espalhado por 14 belíssimos retratos que captam o cúmulo do tempo e da memória latentes nas suas paredes e nos seus objetos.
A sedução é consumada pelas paredes onde as fotografias se encostam, projetadas por Souto de Moura no miolo de um silo automóvel a meio caminho entre o poço do inferno e a ascensão ao céu. (Sugiro visita urgente ao Silo do Norteshopping).
Mas, como nada é por acaso, José Bernardo Távora, que falava com Luís Ferreira Alves na abertura da exposição, tocou na corda tensa da atualidade.
Contava como Siza lhe dizia que a obra precisa de tempo. Da passagem do tempo. Contava como, por aqueles anos - há 40 -, se demorava uma hora a chegar ao atelier na Batalha, só havia um telefone que se usava à vez, se parava para a sacrossanta hora do lanche e, mais importante do que tudo, se tinha tempo para discutir cada problema, às vezes horas inteiras, durante tardes inteiras.
Dizia que este tipo de arquitetura parecia ter acabado, esmagada pela obsessão da "chave na mão" que projeta, constrói e decora, com a pressa de quem não sabe que o tempo "é o derradeiro elemento de transformação que não tolera erros".
A mesma mágoa ou a mesma maldição parece querer fazer-se sentir no tempo político onde ninguém parece poder dispor daquele tempo mínimo de pousio que os arquitetos dão às suas obras antes da "entrada dos monstros", ou seja, dos seus ocupantes.
Enquanto José Bernardo Távora vagarosamente lembrava seu pai, mestre de Siza, o congresso do PSD esquissava com impaciência febril o retrato político da presidência de Rio que, escassos dias depois, me lembra de novo a Casa Beires, carinhosamente apelidada de "a casa bomba" por ser um cubo que tivesse sofrido uma explosão numa das arestas.
ANALISTA FINANCEIRA