Francisco Louçã uniu fações, leu bem a realidade do país, transformou o Bloco de Esquerda num partido de causas. Que, direta ou indiretamente, venceu quando foram adotadas pela sociedade.
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João Semedo, médico, dedicou-se à defesa do Serviço Nacional de Saúde e foi também ele o motor da discussão sobre a morte medicamente assistida.
E Catarina Martins? Conseguiu segurar a herança de ambos, mesmo quando todos poderiam desvalorizar os seus dons tribunícios se comparada com Francisco Louçã. Ela pode até agitar a bandeira dos melhores resultados eleitorais de sempre do partido, se não se esquecer do papel decisivo de Marisa Matias. Ou reservar para si a capacidade que teve na simplificação da linguagem. Ponto. Desde aí soma derrotas. E sai sem glória.
É por isso difícil de perceber a justificação que dá para sair de palco, ancorada no alegado normal processo democrático do partido.
Catarina Martins sai porque não tem mais nada a dar ao BE e porque o BE parece não ter mais nada a dar ao país. Sai porque fez parte de uma solução parlamentar que levou o PS ao Governo em 2015 e que, como já aqui se escreveu, produziu um único vencedor, António Costa. Sai porque leu mal a realidade, não percebeu o país, não tem causas, perdeu o eleitorado.
Numa coisa, sem o dizer, tem razão. A crise do BE é a crise que atravessa a Esquerda que esteve na geringonça e que fomentou a perda de identidade nas urnas e nas ruas, permitindo o surgimento de movimentos ditos independentes do sistema, para quem a democracia é atávica. O fim do ciclo político, que a dirigente convoca, pode ser, sim, o fim de um partido que perdeu as pontes com a sociedade.
Mas se Catarina Martins foi a atriz de outros discursos e lideranças, a Mariana Mortágua, a senhora que se deve seguir, a deputada-estrela das comissões de inquérito ao BES, falta-lhe em adesão social o que lhe sobra em radicalismo oratório.
O Bloco corre o risco de ser apenas reprodutor de cópias. Daí à total irrelevância vai um passo.
Diretor-Geral Editorial