A crise económica tem sido o pretexto para o reforço da intervenção do Estado, mesmo nos países em que, por tradição, mais se confia no mercado. A razão é pragmática mais do que ideológica: na situação actual, não se sabe como, ou mesmo se, os actores privados reagiriam a incentivos de estímulo à procura. Não é certo que as empresas aumentassem os seus investimentos por se baixar o imposto sobre os lucros ou por se criarem condições fiscais favoráveis a novas iniciativas. E o mesmo se diga em relação às famílias, mesmo quando têm um emprego estável. Não quer dizer que se devam abandonar essas frentes. São é precisos impulsos adicionais. Perante a dimensão do desafio, não se podem correr riscos. A despesa pública tem uma determinação política. As restrições resultam da dívida, pública e privada, do país e da expectativa internacional sobre a capacidade de o país a honrar, ou seja, de não entrar em incumprimento. Dentro desses limites, pode-se injectar mais liquidez na economia. A maneira como se passa à acção não é, contudo, neutra estando em causa as características que as despesas devem verificar e a forma como a intervenção deve ser feita. Nem toda a despesa tem a mesma eficácia no combate à crise. Despejar dinheiro para cima dos problemas não é o melhor método de os resolver ou, sequer, de estimular a economia. As despesas devem ser centradas nos problemas e contribuir para melhorar o bem-estar dos cidadãos, minorar a dependência externa do país, induzir comportamentos mais orientados para a sustentabilidade, acorrer às situações sociais mais graves, promover a solidariedade, aumentar as qualificações, recompensar o trabalho e estimular a integração. Devem assentar em projectos que produzam efeitos rapidamente. E não devem aumentar o peso estrutural do Estado, ou seja, devem ser temporárias, desenhadas para acudir a situações de emergência e para serem cessarem tão logo desapareça a razão que lhes deu origem. Ao contrário do que alguns querem fazer crer, sociedades que delegaram no Estado a função de organizar a vida económica empobreceram em termos relativos, quando não em termos absolutos.
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Mas a eficácia da despesa depende da forma como a intervenção se faça. Os projectos que cumprem os requisitos atrás estipulados são, no geral, pequenos e respondem a problemas concretos, ainda que com um denominador comum mais geral. Por exemplo, melhorar a eficiência energética das escolas. Ser no interior, no litoral ou no sul, perto do mar, de um rio, voltada a sul ou a norte, faz toda a diferença. Toda a gente o sabe, mesmo os burocratas. Num Estado centralizado e centralizador, a resposta é tentar codificar tudo. O que não apenas não é possível, como atrasaria todo o processo. Mesmo que a contragosto, a necessidade de responder aos efeitos da crise tem levado o Estado a reconhecer a necessidade de descentralizar, delegar decisões, adoptar a subsidiariedade. Tanto no que diz respeito a despesas de investimento, como a despesas com uma matriz social. Não sem uma cerimónia em que nos façam notar esse acto de boa-vontade. Parafraseando o poeta, resta esperar que estes actos que inicialmente se estranham, acabem por se entranhar. Afinal a crise pode ser boa conselheira!