Manuela Ferreira Leite obstinou-se em destruir politicamente Pedro Passos Coelho com tal determinação que deixou bem radiografada a frieza do seu temperamento. Eliminou-o das listas eleitorais, queimou tempo - eternidades! - para permitir ao seu favorito Paulo Rangel retornar, sebastiânico, e enfrentar o ogre do aparelho - e bem salgaria o chão que Passos Coelho pisou até sexta-feira, dobro de 13.
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Não o liquidou: duplicou-o no partido. Não juntou as forças hostis ao favorito: assistiu, impotente, à visceral cizânia entre os seus dois campeõezinhos.
Não salvou o partido: deixou-o em situação patusca e embaraçosa - e vai ter de resolver uma melindrosa questão de carácter e coerência pessoal.
Balancete do razão: as contradanças no PSD podem ter blindado José Sócrates e garantido a indissolubilidade do Parlamento. Tais são os caprichos de uma culatra extravagante
Passos Coelho pode ser, agora, a única pessoa com razões para desejar eleições antecipadas, não por mor do país, mas por razões de partido: teve mais de 60 por cento do PSD, mas é o 'resto' quem está São Bento. Eleições antecipadas já nem seriam para ganhar o Governo, mas tão-somente um grupo parlamentar.
E quem vai dar as eleições antecipadas a Pedro Passos Coelho? O grupo parlamentar? Oferecendo-se à imolação? Kamikazes? Ná, que diabo!, o desemprego lá fora está de ananases?
Cavaco dar-lhe-á as antecipadas? Cavaco fez tudo - até enodoar-se irremediavelmente - para entregar São Bento de Cima a Manuela Ferreira Leite. Mas era por ser Manuela Ferreira Cavaco Leite. Não encontrará razões para o entregar a Pedro Passos Coelho, que não lhe é venerador nem obrigado.
Que divertido vai ser ver o Cardeal Pacheco Pereira, que já afinava o ferramental inquisidor para a Comissão de Inquérito, pressentir-se abelha: quanto mais ferroar, abatendo Sócrates, mais dolorosamente morre, perdendo o lugarr.
Manuela Ferreira Leite está com um problema de espelho: a senhora que afastou Passos Coelho, por achar incoerente a discordância do militante de manhã e a concordância do deputado com o partido à tarde, vai ter de responder ao bumerangue político que inventou.
O paradoxo: tudo isto não terá de acontecer assim, se Pedro Passos Coelho for, afinal, um verdadeiro homem de Estado e de fidalguia de carácter que os seus detractores nunca deixaram supor.
Ah!, e mais esta ironia: vai ter mesmo de ser Passos Coelho a perdoar Alberto João Jardim - e não o contrário.