Às pessoas que têm dificuldades em conviver com a democracia devia ser-lhes oferecida a possibilidade de viverem noutro tipo de regime.
Corpo do artigo
Seria uma espécie de incentivo à mudança de país, para ver se conseguiam, noutras latitudes, conhecer sistemas políticos alternativos, face à impossibilidade de lhes ser facultado um bilhete de volta ao passado português, porque o DeLorean do "Regresso ao futuro" só está disponível em filme.
Costumo atribuir tanta importância ao pensamento de um jovem como ao de um sénior. Quando preciso de conhecer o passado do meu país em versão ditadura, além dos livros, gosto de percorrer casos práticos, pelo que me dá imenso jeito ter um sogro ali mesmo à mão. E então, o senhor Salvador, que defendeu a pátria nas ex-colónias para escapar a uma vida em que lhe faltava um bocadinho de tudo exceto o carinho - graças a uma mãe que podia dar origem a um manual do amor -, lá me explica que naquelas aldeias de Trás-os-Montes, nos anos 1950 e 1960, era comum as crianças não terem o que calçar, nem o que vestir e pouco para comer. E até era normal trabalharem, após terminarem a quarta classe. Lá pelos 10, 11 anos.
Este tipo de relato, que descrevi de forma muito, muito sucinta, basta-me para não embarcar no discurso mesquinho do "dantes é que era", do naquele tempo, sim, "havia respeito". Os defensores do Estado velho e bafiento, enterrado em 1974, podem sempre argumentar que nos dias de hoje nem tudo está bem. Nesse sentido, o regime democrático até dá imenso jeito, facultando-nos o direito de emitirmos as nossas opiniões sem estarmos preocupados com quem nos está a ouvir, à vista ou escondido. Na prática, depois, cabe a cada um escolher o que diz e a quem o diz, sendo que, nalguns casos, valia mais a pena estarmos calados. Mas isso, lá está, é só a minha opinião. Haverá quem pense o contrário. E eu respeito. Mas não concordo, de maneira nenhuma, com o centrista Francisco Rodrigues dos Santos, que demonstrou dificuldades em lidar com um despacho sobre as medidas que as escolas devem adotar para efeitos do direito à autodeterminação da identidade de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa. As considerações são tantas e tão absurdas que nem vou perder tempo com elas aqui. Mas importa ter presente que não fica mal aceitar as determinações emanadas de um Parlamento eleito democraticamente, ainda que não gostemos, aceitando a diferença e compreendendo a evolução.
*Editor-executivo