Ao noticiar-se que o Governo celebrou esta semana o segundo aniversário da vitória eleitoral, fomos chamados à realidade. Afinal, ainda só passaram dois anos. A degradação económica e social que estamos a viver por ação deste Executivo e a falta de perspetivas em relação ao nosso futuro, fazem destes 24 uma eternidade, um tempo sem fim. Dois anos deprimentes, sem uma boa notícia consistente, sem um raio de sol que nos faça ter esperança, sem qualquer orientação confiável. Dois anos que não são para esquecer, porque não será possível varrer jamais estes tempos da nossa memória. Dois penosos anos que parecem 20!
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Em dia de aniversário, lá tivemos as encomiásticas declarações feitas por voluntários à força afirmando as imensas virtudes do Governo e repetindo o estafado discurso que atira para governos anteriores a culpa de tudo o que se está a passar, com particular relevo para os socialistas que até assinaram a rendição com a troika. Nada que, no quadro de insensatez que vivemos, seja já surpreendente.
Sucede que, ironia das ironias, o INE publica nesta mesma data os últimos dados sobre a situação económica do país referentes ao primeiro trimestre. Como infelizmente já todos sabíamos (menos o ministro das Finanças e o primeiro ministro, a acreditar nas suas declarações públicas), continuamos a afundar-nos penosamente. O produto interno bruto continua a decrescer, agora 4% face ao trimestre homólogo de 2012, situação só ultrapassada negativamente por Chipre e pela Grécia. A procura interna volta a degradar-se e o investimento dá um tombo de 16,8%. A balança comercial, essa, continua a equilibrar, não à custa de um sensível aumento das exportações, como o Governo previu, mas antes por causa de um forte decréscimo das importações, como decorre da contínua queda da procura interna e do investimento. O emprego, para mal de todos nós, continua também em queda, como não podia deixar de ser face ao quadro atrás descrito. Mais 101 mil portugueses engrossaram neste trimestre o caudal assustador do desemprego.
É a espiral recessiva de que falava o presidente da República definitivamente instalada.
Como pode, então, vir o primeiro-ministro em dia que para si foi de festa mas para muitos portugueses foi de luto, afirmar sentir-se orgulhoso do trabalho feito? Só por manifesta cegueira e por viver fora da realidade. Os números não mentem.
Mas não se ficou por aqui Pedro Passos Coelho. Como se não fosse já suficientemente grave a sobranceria com que se orgulha das tremendas dificuldades que as políticas erradas que protagoniza nos impuseram, veio ainda demonstrar um supremo desprezo pela opinião dos cidadãos. "Não tenho medo do resultado das autárquicas, não tenho medo do resultado das europeias, não tenho medo dos portugueses nem dos seus julgamentos..." . Como pode um primeiro-ministro eleito democraticamente, que simultaneamente é presidente de um partido com a responsabilidade e a história do PSD, permitir-se uma tal arrogância e uma tão grande falta de sensibilidade e cultura democráticas? Até onde vai o autismo do chefe do Governo? Uma coisa seria dizer ser seu entendimento que nem nas eleições autárquicas nem nas eleições europeias é a atuação do Governo que está a ser julgada. Outra, bem diferente, é aquilo que disse.
Pelos vistos, nem o primeiro-ministro nem os seus próximos se dão conta dos danos, porventura irreversíveis, que estão a causar ao país. A falta de credibilidade com que o Governo é hoje visto pelos portugueses e, sobretudo, pelos agentes económicos, é um fator fortemente penalizador da sua própria ação.
Como se sabe, a confiança é um elemento essencial ao desenvolvimento da atividade económica e à recuperação do país. Neste momento, como o demonstram sucessivos estudos de opinião, a credibilidade do primeiro-ministro e do seu Governo bateu no fundo. Medidas acertadas como a baixa do IRC ou o crédito fiscal arriscam-se a ser quase inúteis e a não serem mobilizadoras por já ninguém acreditar na consistência das propostas vindas do Governo. O FMI, pelo seu lado, assume que errou e dá também uma ajuda a todo este descrédito ao considerar inadequadas as políticas que impôs aos países "resgatados" depois do primeiro-ministro as ter seguido cegamente e até as ter considerado insuficientes. Que desespero. E ainda faltam dois anos!