Após anos seguidos de consumismo desenfreado, em larga escala provocado pelo acesso fácil ao crédito proporcionado por uma Banca agressiva nas políticas de marketing, os portugueses estão agora muitíssimo mais comedidos.
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Não foi apenas a recessão e o fecho da torneira aos empréstimos a baixo preço a mudar os hábitos dos que ainda têm margem de manobra para tal - sim, porque os que já estão de bolsos vazios e na miséria ou perto dela já não dispõem de opção.
Ontem revelado, o Boletim de Estatística de Agosto do Banco de Portugal é indiciador de uma alteração do comportamento de boa parte dos cidadãos nacionais, confirmando uma tendência recente: a da poupança.
Até como fórmula para obviar às dificuldades de financiamento de que está a ser vítima no mercado internacional, o aumento das taxas de juro oferecido pela Banca é factor apelativo - e terá alavancado também a transferência de alguma poupança dos Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro.
Não creio, no entanto, ser esse o único motivo a ditar a subida do valor dos depósitos a prazo na ordem dos 6,1 mil milhões de euros no espaço de um ano.
A incerteza quanto ao futuro é crucial e julgo dever ser tida em conta para justificar a adopção de um novo comportamento aforrador. Os tempos difíceis pelos quais Portugal passa estão cada vez mais interiorizados pelos cidadãos - sobretudo a partir da altura em que já perceberam não existirem constrangimentos provocados apenas no plano interno. A crise do euro nunca, como agora, ajudou à consciencialização.
O facto de os portugueses parecerem hoje mais propensos para a poupança é, pois, uma boa notícia, não obstante existir uma aparente contradição: o pulo da poupança - mais 1,9 só de Maio para Junho - foi acompanhado pelo aumento do crédito malparado.
Na esmagadora maioria dos casos é aceitável, compreensível até, que o incumprimento de muitos dos créditos obtidos no chamado tempo (virtual) das vacas gordas - ou da inconsciência generalizada - não tenha correspondência com o grupo de cidadãos contribuintes directos no aumento dos valores depositados nos bancos nacionais. Faz sentido. Mas não será de excluir a hipótese de a divergência de movimento entre depósitos e crédito malparado ser protagonizada por uma parte de cidadãos portugueses adeptos da tese segundo a qual enquanto o pau vai e vem folgam as costas. Um raciocínio tanto mais de levar em linha de conta quando o país vive ao retardador nos trâmites da Justiça para a recuperação de crédito e há sempre mais um prazo para negociar...