Foi Robert Schuman quem disse, naquela que poderá ser a primeira declaração a favor da criação de uma Europa Unida, que "a Europa não se fará de uma vez".
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Pois bem, ontem, a Europa, que começou com seis países e depois cresceu sucessivamente para nove, dez, 12, no momento em que aderimos com a Espanha, em 1986, e hoje tem 27 países com mais uns quantos em fila de espera, esta Europa deu um passo mais com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa.
À esperança inicial do tratado, lançado em 2001, sucederam-se anos pessimistas, quando França e Holanda, em referendo, recusaram o compromisso. Uns quantos desaires mais tarde, alguns recuos menos dignos e honrosos depois, a União conseguiu, enfim, dar um passo. Mas é um passo titubeante, provando que realmente "a Europa não se faz de uma vez".
Frequentemente, surgem lamentos sobre a falta de lideranças fortes nos países europeus e na própria União, deixando os países incapazes de encontrar soluções que ultrapassem interesses individuais em nome do desenvolvimento de todos. Não há hoje, realmente, na União Europeia estadistas como Schuman, Jean Monnet, Jacques Delors, Willie Brand e outros. Mas a União Europeia é hoje um espaço de paz e democracia, de justiça e um espaço de livre circulação de pessoas. E isto é um avanço grande em relação ao início, e enorme se considerarmos a história de alguns dos parceiros que foram apanhando esta carruagem e garantindo para os seus países essa mesma paz, democracia e justiça que de outra forma poderiam estar ameaçadas. É certo que, à falta de líderes fortes, veio juntar-se uma escolha débil, titubeante, para os novos cargos que o novo tratado acrescenta à União. Mas é preciso acreditar que as novas regras ajudarão os parceiros europeus a crescer e que a velha Europa não entrará em decadência porque será capaz não só de responder aos desafios do mundo contemporâneo como também de satisfazer as necessidades dos seus cidadãos.
P.S. - A Associação dos Comerciantes do Porto apelou ontem ao boicote aos produtos da TMN, GALP e EDP, que são os patrocinadores do Red Bull Air Race, como forma de protesto à eventual deslocalização do evento para Lisboa. Neste mesmo jornal, também ontem, o prof. Alberto Castro escrevia que o Red Bull "só faz sentido em Lisboa, pela ordem natural das coisas". E acrescentava: "Só não será lá se o Governo decidir governar, ou seja, fazer acontecer o que de outro modo não aconteceria". Se o Governo não o fizer, escrevia Alberto Castro, só mesmo "usando a linguagem que (as empresas patrocinadoras) conhecem: deixar de ser cliente delas". O Red Bull, convenhamos, vale pouco, em si mesmo. Importante mesmo era vermos os nossos índices de emprego mais próximos da média nacional ou nossa maior taxa de iliteracia eficazmente combatida. Isso, sim, é importante. Mas o Red Bull, sendo um sinal do centralismo, pode ser um pretexto. Em Portugal, cultiva-se pouco e mal o direito à indignação. Esta parece uma boa causa. Por que não agarrá-la?