Há três anos, mais coisa, menos coisa, Marine assumiu o lugar do pai, Jean-Marie. A coisa seria irrelevante se o seu nome de família não fosse le Pen. E se a sucessão não dissesse respeito à Frente Nacional, principal partido da extrema-direita francesa. Todos - ou, espero, pelo menos a grande maioria - estão conscientes de que a crise europeia reforçou, e de que maneira, os grupos políticos extremistas, à direita como à esquerda (mais à direita).
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Para evitar confusões, utilizo a expressão "extremista" no sentido de grupos ou organizações políticas que, mesmo não o assumindo explicitamente, têm um ideário nacionalista, intolerante, xenófobo ou racista e defendem um modelo de autoridade pública que dificilmente se distingue do autoritário.
Nesta perspetiva, por exemplo, será mais grave o Aurora Dourada grego (refastelado na sua simbologia nazi) do que a Frente Nacional francesa: mas trata-se, apenas, de uma questão de grau. E o maior perigo da FN vem, provavelmente, da sua "respeitabilidade". E de estes grupos estarem a galgar terreno na União Europeia (veja-se o crescimento explosivo do UKIP britânico).
A Frente Nacional é uma criação de Jean-Marie le Pen, ainda nos anos setenta do século passado. O indivíduo é racista, brutal, xenófobo, antissemita até às orelhas e para lá delas. Mas é também arguto e persistente (inteligente não consigo dizer), e conseguiu, a partir dos anos oitenta, que a FN crescesse e se tornasse relevante. Quando em 2011 cedeu à filha o seu lugar, a FN é já, para o bem e para o mal, o terceiro partido político francês.
Muitos davam pouco pela nova líder, Marine le Pen. Enganaram-se. Mais apresentável do que o pai, mais soft (na aparência), reorientou o partido, retirou-lhe algum do lado folclórico de uma extrema-direita do séc. XX que o partido político ainda conservava. E até se tem dado ao trabalho de sancionar os seus eleitos que, quando lhes foge a boca para a verdade em que acreditam, desatam a lançar propósitos racistas.
Já estamos por isso longe dos tempos em que o pai, cavernícola e rasteiro, classificava como pormenor da história o genocídio judeu ou fazia trocadilhos odiosos em torno dos fornos crematórios dos campos de concentração.
Esta "nova" extrema-direita alimenta-se, como a peste, com o desemprego, a falta de esperança, as crises sociais e económicas. E aproveita, além disso, gulosamente o erro trágico dos partidos mais "tradicionais", da direita ou da esquerda, que para não perderem os seus votantes aceitam renegar convicções e ter um discurso mais intolerante ou "nacional", seja em relação aos imigrantes, seja em relação a afirmações políticas que pareçam razoavelmente nacionalistas.
Agora, estão próximas as eleições europeias. Há tempos, a Frente Nacional cavalgava no topo, agora disputa com a direita o primeiro lugar. Os socialistas franceses, por seu turno, arriscam uma tareia das grandes.
Ah!, mas são "só" as europeias, ouço dizer. Estão muito enganados. Por um lado, porque desqualificam as eleições europeias. Em segundo lugar, porque vão garantindo resultados "respeitáveis" a quem nunca deveria ser dada essa oportunidade. Marine le Pen, essa, diz "merci".