O editorial da "Nature", em 19 de janeiro de 2023, é dedicado à formação doutoral: PhD training is no longer fit for purpose: It needs reform now.
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Não há hoje líder mundial, de Biden a Xi Jinping, que não afirme publicamente esperar que a ciência e a inovação contribuam para o crescimento e desenvolvimento dos seus países, afirmando a necessidade de reformas na formação dos investigadores para que estes possam responder aos novos desafios sociais. E remetem as propostas concretas para um estudo realizado com este propósito: Towards a Global Core Value System in Doctoral Education.
Nos últimos 30 anos, em Portugal, a visão e o rumo foram marcados pela necessidade de formar doutorados, muitos, no país e no estrangeiro, para enfrentar os desafios do crescimento do Ensino Superior e do sistema científico. Os concursos de bolsas e de apoios financeiros estimularam a atração de candidatos em todas as áreas disciplinares e os mecanismos de avaliação foram, até agora, o principal garante de qualidade. Temos hoje cerca de 40 mil doutorados a trabalhar em investigação no Ensino Superior, nas empresas e em outras instituições de ciência. Porém, estes são apenas 36% do total de investigadores.
Desde há alguns anos que, por cá, também se vem assinalando a necessidade de reforma do ensino doutoral. Com a troika vieram a "tesoura de podar" e a ideia de que o país tinha doutores e doutorandos a mais. Não temos. Em 2018, estabeleceu-se a necessidade de reforçar a ligação dos programas de formação às atividades de pesquisa desenvolvidas em unidades de investigação e reforçou-se o papel da A3Es e da FCT nos processos de acreditação daqueles programas e na avaliação da qualidade da sua investigação.
Neste momento, estão em debate a realização dos doutoramentos em entidades empregadoras e a possibilidade de outorga de doutoramentos pelos institutos politécnicos. O mínimo que se pode dizer é que, para além do valor de cada uma das propostas em discussão, o esforço de formação doutoral tem de continuar. Atualmente, existem cerca de 23 mil estudantes de doutoramento em programas para os quais as universidades não recebem financiamento público. Menos de seis mil doutorandos beneficiam de bolsa. O esforço de financiamento da formação doutoral reside, pois, nos próprios estudantes e nas universidades que, para assegurar e apoiar esta formação, redistribuem os recursos próprios.
Também em Portugal é necessária uma visão para a formação doutoral com objetivos, metas e regulação eficaz. Talvez esteja na hora de o fazer, aproveitando o debate público em curso.
*Professora universitária