<p>O ministro da Presidência disse ontem "perceber mal" a criação de convergências à Esquerda defendida por Manuel Alegre, referindo que isso "não é pensável sem as forças maiores da Esquerda portuguesa". "A ideia das Esquerdas se juntarem convergindo para combater, ou para contrariar, a Direita faria mais sentido", acrescentou Pedro Silva Pereira. De facto, faria. No mundo ideal, faria. Sucede que a política tem destas coisas: é dada a oportunismos, aproveita-os como se de pão para a boca se tratassem. É isso que Manuel Alegre está a fazer: a aproveitar a oportunidade aberta pelo difícil estado do país para marcar o "seu" espaço. Com que objectivo? O futuro o próximo esclarecerá essa incógnita magna da política nacional. </p>
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O Fórum das Esquerdas (bonita designação) - e sobretudo, honra lhe seja feita, o discurso proferido no evento por Manuel Alegre - suscitou as mais vivas divagações e os mais díspares comentários. Marcelo Rebelo de Sousa atreveu-se mesmo a catalogar o momento como "histórico", partindo do princípio de que Alegre deu, no domingo, um passo decisivo rumo à secessão partidária dentro do PS. E, por essa via, rumo à reconfiguração do tecido político português, coisa que já não se via desde o mítico PRD de Ramalho Eanes.
Outras almas aventuraram-se a cogitar sobre as possibilidades de o PSD de Ferreira Leite chegar ao poder, aproveitando as fissuras à sua esquerda. Outras ainda gastaram tempo a fazer contas aos votos que Manuel Alegre e Bloco de Esquerda (e restantes descontentes com o Mundo) efectivamente valerão. E outros, porventura mais entusiasmados, terão já discutido que ministérios estariam mais à medida das indiscutíveis qualidades do doutor Francisco Louçã. Enfim, há gostos para tudo...
De regresso à realidade, convinha talvez perguntar duas ou três coisas sobre este interessante caldo.
Uma: os portugueses desejam realmente que o país volte aos tempos em que era governado por uma uma amálgama de gente pronta a esfaquear-se à primeira oportunidade? Resposta: o país não pode, agora mais do que nunca, dar-se a esse luxo.
Duas: o país entende que o PSD, este PSD, está na plena posse das suas faculdades para tomar conta do que quer que seja? Resposta: não está.
Finalmente e mais importante: o país conhece o que pensa a nova "frente de Esquerda" sobre o combate ao défice das contas públicas, sobre a falência do sistema de Segurança Social, sobre o Serviço Nacional de Saúde, sobre o conflito entre professores e Ministério da Educação e outras temas que tais? Resposta: conhece um bocadinho. E gosta? Se gosta, deve empurrar já a "frente de Esquerda" para o poder. Logo se vê de que tamanho será o susto.