Já aqui escrevi sobre a questão hipotética da semana dos quatro dias, brincando com a ideia de passarmos a ter uma semana do fim de semana. Nessa altura julgava que se tratava mesmo de uma brincadeira, que não era nunca para levar a sério.
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Volto ao assunto na crónica de hoje porque o tema não só não saiu da agenda política, como começam a existir muitas pessoas e entidades até governamentais que tentam convencer-nos que a semana dos quatro dias não é uma anedota.
Mesmo que o que tenha sido anunciado seja apenas uma experiência-piloto, só disponível para empresas privadas e aparentemente sem qualquer impacto nos custos do Estado, a verdade é que aquilo que ao princípio parecia ser apenas mais um delírio do Bloco de Esquerda e amigos mais próximos, ganha agora uma capa de seriedade que o Governo lhe emprestou com a sua iniciativa.
Devo confessar que no início ainda cheguei a pensar que esta fantasia da semana dos quatro dias se destinava a melhorar a qualidade de vida de quem privilegiava mais um dia de descanso semanal, em troca da diminuição de rendimento correspondente. Apesar de tudo menos mal. Mesmo sabendo que numa época de dramática falta de mão de obra essa ideia é contraproducente, incluída a revisão em baixa do salário de quem trabalhava e produzia menos, a coisa parecia-me discutível.
Como agora se infere do anúncio governamental, a experiência não envolve nenhum tipo de custos nem para o Estado (que patrocina a ideia sem qualquer patrocínio monetário) nem para o trabalhador, que "experimentará" essa "dificuldade nova" de passar a trabalhar menos quatro dias por mês, ganhando o mesmo.
Como nesta vida continua a ser verdade que ninguém dá nada a ninguém e como não há almoços grátis nem nos dias de gazeta, sobra para as empresas a experiência de ver como resistem aos custos de menos quatro dias de produção, suportando os mesmos custos de mão de obra.
Claro que toda a gente, a começar pelos "iluminados" que defendem a semana dos quatro dias, vai querer continuar a ter tudo disponível todos os dias, dos cafés aos restaurantes, dos shoppings às lojas de conveniência, dos serviços públicos aos hospitais e farmácias. Como é claro também que nenhum destes senhores vai estar disponível para pagar mais pelo que precisa ou quer usar, para que outros possam trabalhar mais, ganhando o mesmo.
A primeira conclusão que é possível tirar é que o Governo do PS saiu da geringonça, mas a geringonça não saiu dele, como é costume dizer. Que é como quem diz: a geringonça, na prática acabou. Mas em algumas ideias, ainda não.
*Empresário