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Ainda Marcelo não teve tempo de se sentar e já Luís Nobre Guedes lhe acena um sucessor. No dia em que Portas bate com a porta, vem ele lembrar que Paulo Portas terá a mesma idade de Marcelo, daqui a 10 anos... Esperemos pois sentados, que o dia é de sucessão, mas a de Portas, à frente do CDS.
A história das sucessões na política portuguesa tem lastro de drama - do PSD pós-Sá Carneiro, ao PS pós-Soares, ao PCP pós-Cunhal e até ao Bloco pós-Louçã. Em alguns desses casos, os partidos sofreram de orfandade prolongada, à procura de um novo líder redentor.
A sucessão de Portas, esta, geriu-a ele mesmo com profissionalismo e inteligência. Anunciou-a pela calada, entre o Natal e o Ano Novo, quando já só se falava de presidenciais. E apontou caminho a dois promitentes discípulos, Nuno Melo e Assunção Cristas, que lhe garantiam a continuidade, sem os traumas da divisão, como que a provar que o CDS existe para lá de Portas, e apesar de Portas.
Nuno Melo preferiu gerir calendário e carreira política. Ele que a vai construindo, consistente, de autarca a deputado à Assembleia da República (onde se destacou no inquérito ao BPN) e ao Parlamento Europeu. Por mérito próprio, alcançou o estatuto de barão, é um ativo firme do partido, uma reserva na bolsa de futuros.
A confirmação de Assunção Cristas, hoje mesmo, é a antecipação da primavera na Direita portuguesa. Cristas é jovem, tem a idade da nossa democracia. Nasceu a 28 de setembro de 74. Tem experiência política e governativa. Foi ministra. E tem revelado traços que são essenciais em qualquer líder: ambição, coragem e desassombro. Se a isto tudo juntarmos o facto de ser mulher e mãe de quatro filhos, ter dado um passo, atravessar-se, chegar-se à frente, são tudo sinais de que a Direita, tradicionalmente portadora do preconceito sexista, quer e está a saber renovar-se.
Há, porém, um problema antigo, à Direita: a tensão entre a corrente neoliberal que comandou o CDS nos últimos anos e os democratas-cristãos (de Adriano Moreira a Ribeiro e Castro) com programas mais associados à doutrina social da Igreja, mas ausentes ou progressivamente marginalizados.
O CDS é um partido liberal ou democrata-cristão? Com Portas, que era até hoje o mais longevo dos chefes partidários no ativo, o CDS foi refém da imagem e do ziguezague ideológico do seu líder. Agora, com Cristas, católica devota, volta a acreditar-se que ela é portadora de renovação, esse aditivo capaz de reconciliar correntes.
*DIRETOR