Vários católicos comprometidos com um caminho de fé, nos quais eu me incluo, estão profundamente incomodados com a posição oficial da Conferência Episcopal. E isso deveria despertar alguns bispos da letargia em que mergulharam. Perante as atrocidades cometidas por alguns membros do Clero, a Igreja deveria declarar um apoio inequívoco às vítimas e afastar preventivamente aqueles que foram acusados de abusos sexuais. O exemplo do arcebispo de Évora tem de ser seguido por todas as dioceses.
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Os crimes de natureza sexual cometidos sobre menores acontecem em várias circunstâncias. Aqueles reportados à Comissão Independente para o estudo de abusos sexuais de menores na Igreja são particulares: ocorreram em lugares ou contextos religiosos, muitas vezes sob a conivência de uma hierarquia que ouviu e não denunciou. Por isso, estes crimes não são individuais, envolvem irremediavelmente a Igreja, o que obriga a respetiva hierarquia a chamar a si a responsabilidade e a agir publicamente em duas frentes: por um lado, unindo-se às vítimas que, sublinhe-se, em determinada altura das suas vidas, fizeram um caminho de fé e aí foram brutalmente vítimas de crimes hediondos; e, por outro, afastando do exercício dos seus ministérios os padres suspeitos.
Não é preciso construir memoriais, porque isso é ofensivo. Nem criar comissões com membros da Igreja no seu interior, porque isso adensa as suspeitas de que se pretende ocultar o que se silenciou durante muitos anos. Promovida uma conferência de imprensa desastrosa, a Conferência Episcopal tem de emendar depressa o que fez. Aqui, o tempo conta muito. Já passaram muitos dias desde que a Comissão Independente apresentou o relatório, sem ter havido, até agora, uma reação à altura da gravidade dos factos por parte da hierarquia eclesial.
No espaço público, muitos católicos já exprimiram o seu desagrado. Dos partidos, praticamente todos os líderes condenaram os termos em que a Conferência Episcopal deu a conferência de imprensa em Fátima. Na Assembleia da República foi aprovado por unanimidade um requerimento para ouvir D. José Ornelas. Os bispos não podem deixar que sejam os políticos e a sociedade civil a remediarem práticas criminosas cometida no interior do Clero. Apregoando a defesa dos mais vulneráveis, a Igreja não pode ter outra atitude que não seja colocar-se inequivocamente ao lado das vítimas e expulsar do seu seio os autores dos crimes. Horríveis, imperdoáveis. Porque, para além de confortar as vítimas, é preciso salvar a fé daqueles que ainda acreditam que a Igreja se constrói com bons pastores.
*Prof. associada com agregação da UMinho