É ao pároco que cumpre desenrugar a alma dos "seus" paroquianos. O peso que carrega nas costas é enorme porque é dele que depende a sobrevivência da Igreja.
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O relato feito entre as páginas 3 e 5 desta edição do JN merece ser lido com atenção. Não é que não soubéssemos já que a Igreja se debate, há alguns anos, com uma agonizante e preocupante falta de padres. O que impressiona é o trabalho feito pelos que sobram - e pelos que, ao arrepio de todos os apelos desta época pós-moderna, decidem consagrar a sua vida a espalhar a palavra de Deus. O padre Paulo, por exemplo, percorre, todas as semanas, 700 quilómetros pelas delicadas estradas das serra da Freita, em Arouca. Tem a seu cargo seis paróquias, 17 igrejas e 3500 paroquianos. É obra!
As causas e as consequências dos tempos difíceis que a Igreja atravessa, plasmados, sobretudo, na extrema dificuldade em recrutar padres e fiéis, já foram escalpelizadas muitas vezes. A figura do padre celibatário não é propriamente uma imagem atractiva para os mais jovens. O apetite pelo material ultrapassa, em larguíssima escala, a necessidade do espiritual. O tempo disponível para a Igreja é muito menor. A crença nos valores e na palavra da Igreja caiu a pique. As respostas dogmáticas e intransigentes da Igreja aos desafios - e são tantos e tão relevantes! - que os novos tempos suscitam são, genericamente, mal entendidas pelos católicos...
Esperar que a Igreja inverta o seu caminho, de modo a ir de encontro ao que os fiéis e não fiéis entendem ser uma postura razoável perante os novos problemas do Mundo, é esperar pelo impossível. Ninguém aguarda que, num belo dia de sol, o Papa assome à janela da Basílica de S. Pedro para nos dizer que, após aturadas reflexões, a Igreja decidiu alterar o seu discurso sobre temas como o preservativo ou a homossexualidade.
E é por isso mesmo que ganha especial relevância a acção individual de cada pároco em cada paróquia. É a ele que cumpre atenuar a impaciência e desenrugar a alma dos "seus" paroquianos. É a ele que cumpre explicar o aparentemente inexplicável. O peso que carrega nas costas é enorme, porque é da sua acção mais ou menos eficaz que depende, em última instância, a sobrevivência da Igreja, sobretudo nas zonas do interior do país onde o envelhecimento e a emigração deixam as povoações exangues.
Os exemplos ajudam. Um padre que explica aos jovens os malefícios do aborto recorrendo a imagens escabrosas de partes do corpo do feto retalhadas (a situação é verídica) presta um mau serviço à Igreja. Um padre que acolhe em sua casa jovens para com eles debater, abertamente e sem peias, o aborto (a situação também é verídica), presta um bom serviço à Igreja. Verdade que, como em todas as "profissões", há bons e maus padres. Sucede que a Igreja, tal como está, não pode dar-se ao luxo de ter "maus" padres.