A profusão de notícias acerca da indemnização recebida da TAP pela ex-secretária de Estado do Tesouro não permite, porém, apreender todos os contornos da questão que lhe subjaz.
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As primeiras informações divulgadas foram que aquela renunciara à função de gestora da Companhia Aérea com cerca de 500 000 euros de indemnização para, a seguir, se referir que tinha sido demitida. Logo depois, afinal houvera um acordo de rescisão do contrato. Para além destas contradições, não se sabe ao certo que tipo de contrato foi assinado entre ambas as partes, data e termo do mesmo, o seu articulado e o vencimento mensal fixo e variável auferido por aquela. Daí que tudo o que se diga ou escreva é mera especulação. Só o MP e a Inspecção-Geral de Finanças, nas respectivas investigações, irão apurar os factos, se houve ilegalidades, nulidades ou a prática de crimes por parte quer da entidade empregadora, quer por parte da ex-gestora, quer por parte de terceiros responsáveis. De acordo com as notícias já veiculadas, o contrato em causa terá sido o de gestão previsto na lei que contempla o estatuto de gestor público, assim considerado quem seja designado para órgão de gestão ou administração das empresas públicas, designação extensível aos titulares de órgãos de gestão de empresa participada pelo Estado. Impõe este diploma que, nas empresas que prestem serviços de interesse público, é obrigatória a celebração de um contrato de gestão, no qual, nos casos em que se estipulam objectivos de gestão de exigência acrescida, se pode, excepcionalmente, estabelecer um regime específico de indemnização por cessação de funções. O gestor pode ser demitido se lhe for individualmente imputável violação grave dos seus deveres funcionais e, neste caso, cessa o contrato sem lugar a qualquer subvenção ou compensação. O gestor pode ainda ser livremente demitido, por decisão fundamentada. Nestes casos, este tem direito a uma indemnização correspondente ao vencimento-base que auferiria até ao termo do respectivo mandato, mas nunca poderá ser superior a um ano. Em caso de renúncia não há lugar a qualquer compensação. Aliás, a TAP, por resolução do Conselho de Ministros de 2021, renovada a 2022, foi declarada em situação económica difícil, mantendo-se assim até 31.12.2023. O estatuto de empresa em situação económica difícil permite-lhe alterar as condições de trabalho e suspender, total ou parcialmente, cláusulas contidas nos acordos de empresa ou nos instrumentos de regulamentação colectiva aplicáveis. Como já antes referi, são muitos os hiatos factuais neste momento para que seja possível alinhar conclusões sobre o comportamento legal e ético dos contratantes neste caso. Mas, para mim, numa empresa com as características em que se encontra a TAP, com despedimentos de trabalhadores e congelamento de salários, são escandalosos os vencimentos e mordomias auferidos pelos administradores e gestores. Casos com estes não podem replicar-se.
*Ex-diretora do DCIAP
A autora escreve segundo a antiga ortografia