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A vida, tão gratificante quanto agreste, ensinou-me a olhar para as despedidas com o pensamento na felicidade do reencontro. Porque só a morte nos separa das pessoas, das coisas e dos hábitos. E até há quem acredite que não é bem assim, graças à fé numa entidade superior que reconstruirá o que de bonito e positivo fomos deixando pelo caminho. Mas não é bom separarmo-nos de ânimo leve, sem dar luta, sem resistir. O tempo é de perda e perigosa aceitação de direitos tão básicos como o de fazer rir. O livrinho A5 das Seleções do Reader"s Digest, que o meu pai há mais de 40 anos todos os meses recebia em casa, e onde aprendi a ler, tinha uma secção imperdível chamada "Rir é o melhor remédio". Convivi com o humor desde cedo, num tempo em que resgatar uma gargalhada não era pecado nem dava despedimento. Nunca fui fã das anedotas sobre alentejanos nem sobre loiras, mas passei uma vida inteira a ouvi-las sem que os autores fossem para a cadeia ou perdessem o emprego por causa disso. As modas mudam como equinócios, agora transformados em ciclos de curtos segundos no que concerne à liberdade de expressão. Quase sem darmos conta, aceitamos sem nos revoltarmos a opressão da palavra. Atentemos no que acontece nos Estados Unidos, onde um comunicador cheio de graça perde o emprego, onde órgãos de comunicação se vergam perante a ascensão de um protoditador. Que ninguém se renda. Que ninguém se despeça da responsabilidade de defender o maior bem de todos: a liberdade. Dizem-me que é lá longe, que Trump está nos EUA. Vou ser simples e simplista: se a covid cá chegou, percebam que este vírus também mata e já anda por essa Europa fora. Que ninguém diga adeus à liberdade sem resistir, porque o caminho de regresso pode ter um custo de milhões de vidas, como aconteceu nos anos 1940. E porque a despedida esteve presente ao longo do texto, aproveito, quando para mim se fecha um ciclo profissional, para agradecer a todos os leitores do JN por dedicarem um bocadinho de cada domingo a ler os meus textos. Um abraço a todos, até àqueles que nos comentários me ameaçam todas as semanas.