Não há que iludir - o Governo teve esta semana uma pequena vitória. Não sei se durará muito tempo. Mas para já e nos próximos tempos, pode reclamar uma vitória que durará o suficiente para condicionar os julgamentos sobre a ação governativa até às eleições autárquicas. Depois de uma crise política de onde só poderia ter saído pior do que estava antes dela, Passos Coelho ganhou uma nova vida. É como se estivesse a jogar PlayStation e tivesse atingido a pontuação necessária para continuar a jogar, subindo de nível. Depois das notícias sobre o decréscimo do desemprego e sobre o aumento das exportações (que deve ser avaliado com ponderação, face ao peso que está a ter a exportação de combustíveis fósseis), o anúncio da interrupção do ciclo de recessão com um crescimento do PIB de 1,1%, superando as expectativas mais otimistas das diferentes instituições que avaliam a evolução da economia portuguesa, não pode ser senão um conforto para as decisões assumidas pelo primeiro-ministro e pelo presidente da República para a superação da crise política.
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Claro que tudo isto é muito ténue, frágil, insuficiente para podermos pensar que o pior já passou. Nem sequer poderemos dizer que já batemos no fundo e que a partir daqui vai ser diferente. Continuamos bem no meio do túnel e a luzinha que lobrigamos é aquela que ilumina um sinal de trânsito que nos alerta para perigos vários. A única coisa diferente é, para já, a atitude do Governo. Desmentido de todas as vezes que anunciou o fim da recessão, usou agora de maiores cautelas na avaliação dos indicadores publicados. Todos os ministros receberam instruções claras para serem prudentes nas suas declarações. E assim tem sido. Como costuma dizer-se, gato escaldado de água fria tem medo.
E não é para menos. É mais do que provável que o défice orçamental supere, no final do ano, o valor de 5,5% do PIB concedido pela troika já depois da renegociação que levou ao alargamento dos prazos. É também previsível que a dívida pública se agrave (no final do primeiro trimestre ultrapassava já os 127% do PIB) podendo chegar aos 130% do produto interno bruto, no final do último trimestre.
Acresce que, por muito que todos precisemos de valorizar estes sinais de recuperação, facto é que o produto continuou a decrescer, 2% neste período, quando comparado com o período homólogo de 2012. Por outro lado, do que se sabe para já, o Orçamento do Estado para 2014 será, uma vez mais, contracionista e penalizador para a procura interna.
Está, por isso, longe de ser sem nuvens o horizonte que alcançamos. Daí que o discurso cauteloso seguido até aqui seja a atitude sensata. Embandeirar em arco face a tantas incertezas seria correr um risco desnecessário. Até porque as próximas eleições autárquicas são agora vistas pelo PSD como uma possibilidade de não virem a ser tão relevantemente influenciadas pela imagem negativa do Governo. O discurso de Passos Coelho mudou 180 graus. Da afirmação proferida há um ano "Que se lixem as eleições, o que interessa é Portugal", que chocou todos os candidatos autárquicos do seu partido, passou recentemente para um outro registo. "Ganhar as eleições e manter a presidência da Associação Nacional dos Municípios" é agora o objetivo avançado na festa do Pontal. Ou seja, ganhar também no número de municípios.
É hoje claro que Pedro Passos Coelho tudo fará para não dar ao partido socialista qualquer argumento que reavive a sua exigência de eleições antecipadas. Agora que os dados estatísticos dão um pequeno novo fôlego ao Governo, o que importa é manter este estado de graça. Guardar ciosamente até ao limite do possível as medidas impopulares que o Orçamento do Estado vai ter obrigatoriamente de conter vai ser um teste à coesão e à capacidade de reter informação relevante por parte do Executivo. Com Paulo Portas mais contido depois da confusão política de que foi protagonista, os "gargantas fundas" do Governo vão ter mais dificuldade em deixar cair informação para os seus comentadores preferidos.
A partir de agora, o foco estará centrado no combate autárquico. Sendo eleições locais, os seus resultados terão sempre uma leitura nacional, o que o próprio Partido Socialista já assumiu ao considerar que será vencedor se tiver mais um voto. Será, por isso, o PS o centro de todas as atenções na noite de 29 de setembro.